Webinar promovido pela PwC Brasil possibilitou explanação sobre como a falta de visão sobre a essencialidade da saúde pode prejudicar o paciente final
31 de agosto de 2020
A fim de tratar dos impactos da reforma tributária sobre o
setor de saúde, a empresa de consultoria e auditoria PwC Brasil realizou mais
uma edição do PwC Debate | Tax, uma série de webcasts que tratam
especificamente das mudanças que estão sendo previstas sobre os impostos em
território brasileiro. O encontro realizado dia 27 de agosto e apresentado por
Romero Tavares e Paula Romano, respectivamente sócio e diretora da consultoria
tributária da PwC Brasil, recebeu Fabio Cunha, diretor do comitê jurídico da
Associação Brasileira de Medicina Diagnóstica (Abramed); Kamila Fogolin,
diretora jurídica da Associação Nacional de Hospitais Privados (Anahp); e
Bernard Appy, diretor do Centro de Cidadania Fiscal e um dos autores da
Proposta de Emenda Constitucional, PEC 45/2019, para alteração do sistema
tributário nacional.
Antes de iniciar o debate, os executivos da PwC Brasil
apresentaram todo o cenário de tributação que está sendo planejado para a
Reforma Tributária, considerando como seria a aplicação do imposto com alíquota
única sobre o setor de saúde. Após explicação técnica, Tavares mencionou que a
pressão eventual sobre os custos dos planos de saúde tende a atingir o paciente
final. “Percebemos que o aumento final da carga tributária sobre os serviços
privados de saúde pode levar a um efeito que não se observa em setores que não
são essenciais que é a eventual redução de cidadãos utilizando a rede privada e
mais pacientes dependentes do Sistema Único de Saúde (SUS)”, declarou.
O impacto direto no SUS, de fato, é uma das grandes
preocupações do setor que considera que caso a Reforma Tributária seja aprovada
nos moldes em que tramita atualmente no Congresso Nacional, o considerável
aumento tanto sobre laboratórios e clínicas de imagem quanto sobre hospitais
impreterivelmente acarretará repasses para o beneficiário. E a explicação de
Cunha tomou esse caminho.
Ao ganhar a palavra, o executivo trouxe todo um panorama que
foi estudado pela Abramed para compreender como seria o comportamento da saúde
suplementar diante da reforma. Segundo Cunha, a iniciativa privada é
responsável pela realização de 70% de todos os exames do setor no Brasil,
principalmente os de alta complexidade. Além disso, é um setor que emprega mais
de 2 milhões de pessoas diretamente.
Paralelamente, o diretor comentou que nos últimos seis anos
mais de 4 milhões de pessoas deixaram de pagar seus planos de saúde, tendo de
recorrer integralmente ao SUS. Com a pandemia de COVID-19, esse cenário tende a
se intensificar, visto que somente nos últimos três meses as operadoras de
saúde perderam mais de 300 mil vidas.
Mesmo contabilizando de forma conservadora o impacto da
Reforma Tributária no setor, Cunha apresentou estudos que consideram uma
redução de serviços que pode alcançar a marca de R$ 11 bilhões. Diante de toda
essa perspectiva, o executivo reforçou que o setor concorda que investir em uma
Reforma Tributária é extremamente importante, que não há interesse de redução
da base tributária, mas que a neutralidade se faz necessária para evitar que
todos saiam perdendo.
Kamila também se manifestou a favor dessa necessidade. “A
gente nem pleiteia a alíquota zero. O que tratamos é a excepcionalidade do
setor de saúde, bem como do setor de educação. Principalmente pois com esse
repasse a conta final quem paga é o paciente”, disse.
Redução do acesso e desemprego
Ao detalhar os estudos que foram elaborados por entidades do
setor de saúde, Cunha apontou todos os inúmeros impactos negativos que estão
sendo considerados, a começar pelo aumento do desemprego no país. “Temos 40% do
nosso custo na folha de pagamento e, em termos de eficiência tributária, a
geração de empregos vai deixar de ser algo bem visto no setor de saúde”,
declarou.
Outro ponto apresentado pelo diretor foi a maior dificuldade
de acesso que a Reforma Tributária pode desencadear. Appy chegou a afirmar que
quem mais consome serviços de saúde é a classe alta, e que o novo formato de
tributação seria bastante justo considerando que é mais benéfico para o país
cobrar impostos da parcela mais rica da população. Como alternativa, o autor da
PEC 45/2019 mencionou a possibilidade de trabalhar a devolução dos impostos às
famílias.
Porém essa linha de pensamento é equivocada na visão de Cunha,
que trouxe novos números para exemplificar que, nesse caso, a classe média será
a mais afetada. “80% dos beneficiários de planos de saúde utilizam planos
coletivos, ou seja, serviços que são oferecidos pelas empresas que os
contratam. Dessa forma, quem está perdendo o acesso são os trabalhadores. Não é
verdade que o gasto com saúde é um gasto do rico, pois todo mundo fica doente e
todo mundo precisa de atendimento”, pontuou complementando que a política de
devolução também não deve funcionar justamente por serem as empresas que arcam
com esses custos.
Além disso, o executivo mostrou que com a classe média
deixando de utilizar a saúde suplementar para estrangular ainda mais o SUS, a
saúde pública que poderia investir esforços em saúde populacional e
epidemiológica, acaba tendo de retomar atendimentos eletivos que antes eram absorvidos
pelas instituições privadas.
Exemplo internacional
Na visão de Cunha, se o Brasil quer seguir as melhores
experiências internacionais, é preciso utilizar o modelo completo. “De todos os
países da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) que
aplicam o Imposto sobre Valor Agregado (IVA), apenas dois não fazem a
diferenciação dos setores de saúde e educação: Japão, que não cresce há mais de
20 anos, e Chile”, declarou. Segundo ele, o Canadá – que também tem alíquota
diferenciada para a saúde – tentou unificar o imposto e não conseguiu,
retrocedendo ao modelo prévio de diferenciação.
Com o argumento de que os especialistas reforçam que o
modelo ideal é o que considera uma alíquota única sem qualquer diferenciação, Appy
explicou que ao abrir uma alíquota diferenciada para a saúde, por exemplo,
abre-se precedentes para que outros serviços como academias e alimentação
também se valham dessa justificativa para pleitear redução tributária. Sobre
esse ponto, Cunha questionou os motivos que levaram a maioria absoluta dos
países que apostam em um imposto único a oferecer diferenciação de alíquotas
para setores essenciais como saúde e educação. “Por que as nações tidas como
referência não ouviram os experts? Por que o modelo historicamente aplicado de
IVA nunca migrou para a alíquota única como sugerem esses especialistas? É
melhor na teoria ou é melhor pois foi testado? O ótimo é inimigo do bom e
precisamos lidar com essa realidade”, finalizou.