Conferência on-line reuniu advogados especialistas para esclarecer temas como redução da jornada de trabalho e salários, negociações contratuais e medidas tributárias
17 de abril de 2020
Ainda
é cedo para medir todos os impactos causados pela pandemia do novo coronavírus no
mundo, principalmente nos sistemas de saúde. Mas, existe um fato inegável: a
crise tem transformado as relações humanas e de trabalho, e os modelos de
negociações e legislações em diversos países. No Brasil, desde fevereiro e até
o dia 15 de abril, a Presidência da República editou 28 medidas provisórias (MPs)
destinadas ao combate à Covid-19. Desse total, 11 abrem créditos
extraordinários para o enfrentamento da pandemia e de seus efeitos na economia.
As
MPs autorizaram, por exemplo, a redução da jornada de trabalho e salários, a
prorrogação de recolhimento de impostos, como PIS/COFINS e INSS. As mudanças
são inúmeras e têm provocado uma série de dúvidas e incertezas em pessoas,
empresas e organizações. Afim de promover o esclarecimento sobre esses temas
para seus associados e demais laboratórios, a Associação Brasileira de
Medicina Diagnóstica (Abramed) realizou, no dia 16 de abril, um webinar
para discutir as atualizações jurídicas e de Recursos Humanos que são frutos do
cenário atual de pandemia.
Participaram
deste evento on-line, com conteúdo gravado e disponível no canal do
YouTube da Associação, um time de advogados especialistas da Machado
Nunes, composto por Daniela de Andrade Bernardo, sócia da área Trabalhista;
Renato Nunes, sócio da área Tributária; Rafael Younis Marques, sócio da área de
Contratos e Societário; e Teresa Gutierrez, sócia da área de Regulatório em
Saúde. O bate-papo foi moderado por Priscilla Franklim Martins,
diretora-executiva da Abramed, e contou com a presença ativa do público por
meio de uma plataforma de vídeo com chat em tempo real.
Corte
salarial e redução na jornada de trabalho
Durante
o evento, a sócia da área Trabalhista da Machado Nunes esclareceu diversos
questionamentos sobre a MP 963 anunciada pelo governo no dia 2 de abril, que
autoriza que empresas reduzam salários e jornadas de funcionários. O texto
permite redução salarial de até 70%, com diminuição da jornada de trabalho, ou
suspensão total dos contratos.
Daniela
explicou que a nova legislação permite três faixas de corte salarial com
redução proporcional da carga horária: 25%, 50% e 70%. No entanto, existem
condições para cada porcentagem. Quando o corte for de 25%, a mudança pode ser
feita por acordo individual entre o patrão e o empregado, independente da faixa
salarial. Nas reduções de 50% e 70% ou suspensão de contrato, os acordos
individuais só poderão ser firmados com empregados que ganham menos de R$ 3.135
ou mais de R$ 12.202,12. Os trabalhadores que recebem entre R$ 3.136 e R$
12.202,11 só poderão ter seus contratos modificados por acordo ou convenção
coletiva, com a participação do sindicato. “O que não pode acontecer é o
funcionário ter o corte de salário, mas não ter a redução da jornada de trabalho”,
alerta.
Sobre
a suspensão temporária do contrato de trabalho, Daniela esclareceu que ela pode
ser feita por até 60 dias e, caso a empresa tenha faturamento anual de até 4,8
milhões, o governo se compromete a pagar 100% do seguro-desemprego. Acima desse
faturamento anual, a empresa precisa fornecer para o empregado uma ajuda de
custo equivalente a 30% do salário. “Durante a suspensão temporária do
contrato, o funcionário não deve enviar nenhum e-mail ou estar à disposição
para solicitar informações. É muito importante que os empregadores entendam
isso”.
Pagamento de
tributos nacionais
Entre
as MPs autorizadas pelo governo para o enfrentamento da pandemia também estão
alterações nas medidas tributárias. Renato Nunes, sócio da área Tributária, destacou
durante o Webinar Abramed a diminuição de 50% na contribuição feita pelas
empresas às entidades que integram o Sistema S e a redução para zero porcento da
alíquota do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) sobre transações de
créditos, ambas as alterações válidas até o dia 30 de junho.
“O
governo brasileiro também concedeu redução temporária, para zero porcento, da
alíquota do Imposto de Importação (II). Essa medida é extremamente importante
no combate à Covid-19, uma vez que estamos importando diversos equipamentos de
proteção individual (EPI), como as máscaras”, acrescenta Nunes.
O
especialista também salientou que o governo publicou uma portaria que prorroga
o recolhimento do PIS/COFINS e da contribuição previdenciária (INSS) por parte
dos empregadores. “Os pagamentos de março e abril, que venceriam em abril e
maio, poderão agora ser integralizados em agosto e outubro. As Declaração de
Débitos e Créditos Tributários Federais (DCTF) referentes aos meses de
fevereiro, março e abril poderão ser realizadas em julho”, explica.
Negociação
de contratos
Diante do agravamento da crise instaurada pelo novo coronavírus, muitas empresas se mobilizaram e notificaram os seus parceiros a respeito da impossibilidade de cumprimento dos contratos firmados, calcadas nos conceitos de caso fortuito e força maior – dos quais o Código Civil estabelece que o devedor não responderá pelos prejuízos que não é responsável, como efeitos imprevisíveis e inevitáveis. Ou seja, em uma relação contratual, mesmo havendo o cumprimento diferenciado da obrigação por uma das partes, esta não responde por eventuais inconvenientes causados à outra.
Mas,
segundo Rafael Younis Marques, sócio da área de Contratos e Societário da
Machado Nunes, a situação pode ser um pouco mais complexa. “Os efeitos da
pandemia são considerados casos fortuitos ou de força maior, mas facilitam no
descumprimento de uma obrigação contratual. O que a Lei prevê é que a empresa
que não pode ser responsabilizada pelos danos causados em casos fortuitos ou de
força maior. Isso não significa, por exemplo, que a empresa não terá que
realizar um pagamento, mas sim que ela estará livre de juros ou eventuais danos
por não ter efetuado o pagamento naquele dia”, esclareceu durante a conferência.
Segundo
Marques, a recomendação para lidar com a relação contratual em tempos de
pandemia é a negociação entre as partes. “A maioria das empresas que estão
negociando tem conseguido um acolhimento das demandas, mesmo ainda que parcial,
porque todo mundo tem bom senso e reconhece a crise mundial”.
Aspectos
regulatórios
“Esse momento está servindo para que as pessoas revejam suas ações e para a Anvisa não foi diferente”, disse Teresa Gutierrez, sócia da área de Regulatório em Saúde da Machado Nunes, sobre a Agência Nacional de Vigilância Sanitária durante o Webinar Abramed. Segundo ela, a entidade reguladora adotou uma série de medidas para acelerar os processos de importação e aprovação, como o que está acontecendo com os produtos de diagnóstico in vitro já registrados no Brasil, que passam a ter análise prioritária para a entrada no país.
“Em
fevereiro, a Agência autorizou a importação de produtos que não são registrados
no Brasil, desde que eles tenham registro em algum dos países que integram o International
Medical Device Regulators Forum (IMDRF). Essa ação internacional que a Anvisa
tem realizado facilita a importação em um momento tão importante quanto esse,
onde existe a competição mundial por equipamentos, medicamentos e insumos”,
acrescentou.
No dia 1º de abril, a Câmara aprovou um projeto para agilizar a liberação de produtos usados no combate ao novo coronavírus pela Anvisa em até três dias. O texto, que cria uma autorização especial durante a crise, ainda precisa ser analisado pelo senado.