Medidas educativas e disciplinares contribuem para melhoria de processos e para a evolução da área de Compliance
12 de abril de 2021
Toda organização possui diretrizes que orientam a
conduta e a forma como os processos institucionais devem ser conduzidos. Para
garantir adesão a essas diretrizes, uma série de ações conjuntas devem ser
conduzidas, com a criação de normas documentadas, implantação de mecanismos de
controles internos, campanhas de comunicação e treinamentos institucionais.
Quando as regras institucionais são violadas,
é necessário que se identifique o que impediu o seu cumprimento. Se houve falha
na disseminação ou compreensão das normas, favorecendo erros, ou se houve uma
infração intencional a uma regra conhecida.
As políticas de consequência, como podem ser
chamados esses documentos, visam estabelecer as medidas e penalidades
institucionais a serem aplicadas quando uma regra estabelecida não é seguida.
Nelas estão previstas ações de remediação e correção para reestabelecer a ordem
dentro de um ambiente organizacional. “As políticas de consequências ou de
medidas educativas e disciplinares contribuem diretamente para a melhoria de
processos e para a construção de uma cultura de conformidade dentro das
organizações”, afirma a Vanessa Queiroz Torres, gerente de Compliance do Hospital Israelita Albert
Einstein (HIAE) e membro do Comitê de Governança, Ética e Compliance (GEC) da
Associação Brasileira de Medicina Diagnóstico (Abramed).
Em organizações de saúde, como são as empresas de
medicina diagnóstica, Vanessa explica que estabelecer um ambiente de Cultura
Justa é fundamental. Isto porque erros na condução das atividades podem ser
fatais. Desta forma, é muito importante que falhas e incorreções sejam
distinguidas de infrações intencionais. “As instituições de saúde precisam
conhecer os erros que ocorrem em seus processos para terem a oportunidade de
corrigi-los e evitar reincidências, protegendo, por consequência, a segurança e
a vida dos pacientes”, destaca.
Por definição, Cultura Justa é um modelo de governança que tem como um dos
seus princípios o fato de que nem todos os erros ou violações de conduta são
fruto de má intenção. A Cultura Justa busca estabelecer um ambiente no qual o
relato de erros e de eventos adversos é favorecido e incentivado. Com a sua
adoção, entre outras coisas, busca-se a criação de um círculo virtuoso, no qual
os funcionários se sentem incentivados a reportar erros e falhas de processos
nas diferentes áreas da empresa, que assim terá condição de aperfeiçoá-los,
evitando que falhas não intencionais sejam cometidas e que as brechas para a
prática de atos intencionais sejam diminuídas.
Cabe à política de medidas educativas e
disciplinares conceituar de forma muito clara e objetiva o que é um erro e o
que é uma infração ou violação. A distinção é fundamental para a definição da
melhor medida a ser aplicada. Vanessa esclarece que os erros devem ser
reconhecidos, compreendidos, em sua causa-raiz, e corrigidos. “Ações educativas
permitem o aprendizado e previnem falhas decorrentes de erros humanos. As
infrações ou violações devem ser apuradas para que se compreenda sua extensão e
impactos e as medidas disciplinares devem ser aplicadas garantindo a justiça e a
credibilidade institucional”, ressalta a gerente de Compliance do HIAE.
Consequências diferentes
As regras devem ser justas. Porém, situações
diferentes merecem tratativas distintas, se necessário. A diretora de
Auditoria, Gestão de Riscos e Compliance do Hospital Israelita Albert
Einstein e diretora do Comitê GEC da Abramed, Viviane Souza Miranda, explica
que uma mesma violação pode ter sido motivada com graus de intencionalidade
diferentes. Como pode acontecer de uma mesma infração ser cometida de forma
reincidente por uma pessoa e pela outra, não. “Se a gente puder garantir que
depois de identificada uma violação, os processos foram corrigidos e os
colaboradores treinados para que aquilo não ocorra mais, um segundo caso
similar no mesmo processo vai precisar de um estudo mais aprofundado para
avaliar se houve a intenção de burlar as regras”, esclarece.
Os fatores para a aplicação de medidas educativas ou
disciplinares devem ser pensados tendo como objetivo maior a melhoria do
ambiente de controle. “Critérios como cargo, danos causados, perdas financeiras
geradas não podem ser balizadores das medidas corretivas a serem aplicadas. A
intenção deve ser sempre evitar que a violação ocorra novamente. Quando a
penalidade for útil para atingir este objetivo, ela deve ser aplicada”, garante
Viviane.
Mas Vanessa Torres reforça que o
objetivo principal é encontrar as fragilidades dos controles dos processos e
corrigi-las e não punir pessoas. Para ela, quem erra precisa aprender enquanto
quem viola tem de ser punido.
Até porque,
diante de um processo falho, quem falhou em cumprir o que estava determinado,
pode ser uma segunda vítima da vulnerabilidade a que esteve exposto. E o Compliance
precisa ser justo e razoável para que consiga construir mudanças necessárias em
parceria com as áreas. “No fim das contas, só se faz Compliance se cada
pessoa também o fizer. Não é a área de Compliance que faz ele acontecer
no dia a dia. São as pessoas que executam atividades, tomam decisões e
compreendem o posicionamento institucional diante de dilemas éticos”, enfatiza
Viviane Miranda.
Ela alerta ser importante enxergar os riscos diante da falta de
uma diretriz sobre medidas educativas e disciplinares. Além da possiblidade de
que se cometa alguma injustiça por ausência de referências de como conduzir
situações de erros e violações, constrói-se uma cultura de insegurança e medo,
pois as consequências de qualquer ato inesperado não são claras para os
colaboradores. Além disso, a tendência é que se tenha reincidência de eventos
adversos, pois suas causas são desconhecidas e perde-se a oportunidade de
construção de um ambiente seguro, de aprendizado, em que melhorias possam ser
debatidas e processos aprimorados.
Por isso, as políticas de medidas educativas e disciplinares são importantes para garantir a ordem e a justiça nas organizações, evitando abusos. “Elas permitem que as medidas punitivas, em especial, possam ser aplicadas sem a violação de direitos trabalhistas e humanos e ajudam às instituições a criar um ambiente de confiança por parte de colaboradores e demais públicos, gerando um círculo virtuoso que favorece a retidão e integridade nas organizações”, conclui a diretora.