Apoiado pela Abramed, evento discutiu o futuro da
saúde e as estratégias necessárias para o desenvolvimento do setor
Um debate muito instigante foi
promovido pela Iniciativa FIS (Fórum Inovação Saúde) no dia 27 de janeiro,
virtualmente. Com o tema “Para onde vai você, Saúde Brasileira?”, o evento foi
moderado por Josier Vilar, presidente da Iniciativa FIS. A Abramed é uma das
apoiadoras.
“Se, através do FIS, conseguirmos
avançar ao longo dos anos com alguns temas que resultem na melhoria do acesso
da população brasileira aos serviços de medicina de qualidade, teremos dado uma
grande contribuição para a sociedade”, destacou Vilar na abertura.
Felipe Salto, diretor executivo do
Instituto Fiscal Independente e especialista em contas públicas, foi o primeiro
convidado apresentado. Segundo ele, por um lado, o Brasil precisa de ajuste
fiscal, equilíbrio das contas e sustentabilidade das dívidas para ter juros
mais baixos, investimento mais alto e crescimento econômico sustentável, e, por
outro lado, precisa de recursos para políticas públicas fundamentais, como de
saúde.
“O Brasil investe 9% do PIB na
saúde, não é pouco, mas esse valor poderia ser aplicado de forma mais
eficiente. Veja o funcionamento das Santas Casas, que têm uma dependência muito
grande de transferências feitas pelos parlamentares, sem as quais elas não
teriam recursos para pagar os custos por mês, o que é muito preocupante. Também
é necessário discutir a Tabela SUS. O que falta no Brasil é fazer uma revisão
periódica do gasto público, o país acabou entrando no piloto automático”,
ressaltou Felipe.
Dando continuidade à fala de Salto,
Luiz Antonio Santini, pesquisador associado da FioCruz, falou sobre o
subfinanciamento do sistema de saúde. “Concordo que precisa melhorar a governança,
a gestão e destinar adequadamente os recursos existentes, mas é necessário
garantir o que preconiza o artigo 196 da Constituição, que a saúde é direito de
todos e dever do Estado. Não podemos continuar a buscar recursos onde não têm.
Chegou o momento de decidir. Não temos direito a arranjos inferiores dentro da
sistemática orgânica do sistema”, destacou.
De acordo com Santini, é possível
melhorar a alocação de recursos e implantar tecnologias e ferramentas de apoio
à gestão, mas faltam recursos. “A medicina brasileira vai para onde for essa
discussão, definindo os papéis dos atores atuantes nesse processo e as
necessidades da população. Temos de discutir com mais profundidade como mudar a
estrutura de organização de financiamento do sistema. A premissa de gastar só o
que arrecada precisa ser tirada da discussão, é fundamental gastar mais, a
saúde precisa de mais recursos”, expôs.
Em sua participação, Paulo
ChapChap, conselheiro estratégico do Dasa para Hospitais e Oncologia, disse que
não é mais preciso defender o SUS, já que é unânime a sua importância, mas o
valor é insuficiente porque é mal distribuído. “Temos de fazer um chamamento à
parte melhor financiada do sistema, que é a suplementar. Deveria ser uma
exigência que o setor privado contribua com o público. Não estou falando do
sistema privado filantrópico, mas de um segmento com finalidade lucrativa, que
desenvolve tecnologia, processos e pessoas. Ele deve ser chamado para ajudar a
resolver essa equação”, disse.
ChapChap aproveitou para fazer um
lamento: os profissionais de saúde estão sofrendo muito. “Quando médicos do
município de São Paulo falam em greve em uma situação de pandemia, é quase um
grito de basta. A combinação da alta expectativa da população com a
incapacidade de oferecer todos os serviços gera uma tensão no cuidado, que leva
a uma grande frustração do profissional de saúde e até insegurança em relação a
ameaças físicas”, expôs. Para ele, é preciso ter um cuidado especial com os
profissionais da linha de frente, fazendo algum movimento contundente, nem que
seja temporário.
Fundador do E-Health Mentor
Institute, Guilherme Hummel participou da discussão com seu amplo conhecimento
em tecnologia. Ele se mostrou descrente em relação a soluções de curto prazo
para melhorar o acesso da população à saúde. “O Brasil tem uma mentalidade
muito complicada para executar ações em médio e longo prazos, nós não pensamos
no futuro”, criticou.
Para Hummel, acesso não é problema
de recursos. Recursos são importantes na média e na alta complexidades, sem
dúvida, mas na baixa complexidade o problema é técnico. É preciso pensar sob
uma ótica estrategicamente diferente. “Um problema compartilhado é resolvido,
mas um problema fragmentado é multiplicado. No Brasil, os problemas não são
compartilhados. A fragmentação do sistema é monstruosa e cada vez maior porque
não existe parâmetro claro sobre a estratégia a ser atendida”, frisou.
O fundador do E-Health Mentor
Institute mostrou as premissas para um sistema de saúde de maior qualidade,
especificamente na baixa complexidade. Uma delas é agir em rede, isto é, com
plataformas abertas, o que melhora a transversalidade da informação. Outra
premissa é que tudo é código, tudo é programável. Sendo assim, a regulação é
flexível. “E, se é assim, tudo é registro de dados também. Num primeiro
atendimento, o registro é fundamental, não se melhora acesso sem essa
transversalidade de dados”, expôs.
Hummel também citou que todas as
estratégias precisam levar em consideração a nuvem como SaaS (software como
serviço), que permite acesso a qualquer dado de paciente em qualquer lugar, sem
necessidade de infraestrutura. “Isso significa que é preciso ser ‘figital’, ou
seja, físico, digital e social. É imprescindível a flexibilização.”
Outro item elencado por ele é a
necessidade de baixar o analfabetismo de saúde básica no Brasil. “As pessoas
vão chegar aos 15 anos sem nenhum cuidado, sem nenhuma articulação com sua
conduta sanitária. É preciso incluir o uso do smartphone dentro das ações em
saúde. Desde a primeira escolaridade, o indivíduo deve receber instrução básica
sobre saúde e também sobre utilização da internet. Isso é alfabetização em
saúde e precisa acontecer, necessariamente junto com o autocuidado.”
Para Hummel, só há uma forma de
sair do problema de custeio: reduzir rapidamente a demanda dos sistemas de
atenção, não há outra possibilidade.
Já na análise do deputado federal
Dr. Luizinho, a falta de definição sobre quem tem a responsabilidade por cada
atividade na área de saúde atrapalha muito. “As atribuições e competências de
forma mais clara podem nos ajudar na melhoria do sistema e na partilha dos
recursos”, disse.
A respeito da hierarquização do sistema
de saúde, Luizinho salientou que o único sistema universal em que qualquer
pessoa recebe a prescrição do medicamento mais caro da rede é o brasileiro.
“Nenhum outro sistema do tipo sofre com a mesma falta de hierarquização.”
O deputado federal também defendeu
a ampliação do acesso à saúde suplementar. “O Brasil tem espaço para um número
maior de usuários na saúde suplementar através de planos mais acessíveis. Este
é um assunto polêmico, mas faço questão de colocar a minha opinião.”
Durante o
debate, vários profissionais de saúde reconhecidos no setor fizeram suas
perguntas aos convidados, enriquecendo ainda mais a discussão. No canal do You Tube do FIS podem ser
vistos todos os webinares já realizados.