Fórum “Ética em Medicina Diagnóstica, promovido pela SBPC/ML, fechou 52º Congresso Brasileiro de Patologia Clínica/Medicina Laboratorial
01 de Outubro de 2018
A Abramed (Associação Brasileira de Medicina Diagnóstica) participou, entre os dias 25 e 28 de setembro, do 52º Congresso Brasileiro de Patologia Clínica/Medicina Laboratorial, promovido pela Sociedade Brasileira de Patologia Clínica / Medicina Laboratorial (SBPC/ML). A presidente da entidade, Claudia Cohn, compôs a lista de debatedores do fórum “Ética em Medicina Diagnóstica”, mediado pelo presidente da SBPC/ML, Wilson Shcolnik, que fechou o evento, no dia 28.
Os palestrantes foram o procurador da República e coordenador da Operação Lava-Jato em Curitiba, Deltan Dallagnol, e o promotor de Justiça em São Paulo e presidente do Instituto Não Aceito Corrupção, Roberto Livianu.
Iniciando sua explanação, Dallagnol fez um retrospecto dos números da Lava-Jato e questionou por que pessoas com altos salários continuavam envolvidas em corrupção para ganhar mais. Ao indagar o motivo pelo qual as pessoas se corrompem, respondeu: “Impunidade e ganância. Esses podem ser os pontos-chaves para entender o que aconteceu no Brasil”, afirmou.
Os números e os dados – mesmo para quem conhece os caminhos da operação no país – impressionam. “O que nos move é o mesmo que inspira o trabalho de vocês. Lutar contra o sofrimento humano”, pontuou o procurador, relacionando seu trabalho com a área de saúde. Ele contou que, certa vez, em uma consulta de rotina, explicou ao médico que não estava comendo direito, não praticava atividades físicas regulares e não dormia bem. A resposta que recebeu traduzia o que sente boa parte do povo brasileiro. “Deltan, pode continuar comendo mal, dormindo mal e sem fazer exercícios físicos porque o corpo aguenta, mas continua firme na Lava Jato”, disse o médico.
Ao longo dos relatos sobre diversos momentos da operação, ele lembrou que primeiro é preciso o diagnóstico, mas que também é necessário continuar o tratamento. “Diagnosticar não resolve o problema da saúde, assim como não resolve o problema da corrupção. A mudança é necessária. É o mesmo efeito de um antibiótico que não fez efeito. A infecção volta.”
Na palestra seguinte, Roberto Livianu citou momentos vividos pelo país, onde o combate à corrupção sofre pressões políticas para que não vá adiante. “Precisamos de mais mudanças, mas não conseguimos fazer sozinhos, e a sociedade acredita que pode mudar o rumo das coisas.”
Entre outros pontos, Livianu trouxe para o debate questões como o conflito de interesses em diversas áreas, lembrando que a interpretação não pode ser diferente se for para benefício próprio ou de outra pessoa. “Integridade não é modismo. Ou se tem ou não tem. Deltan falou em união e essa é a palavra-chave. Não podemos ficar nos lamuriando. Precisamos agir. Cada um fazendo a sua parte a situação pode, sim, ser diferente; se todos nós agirmos.”
A posição de diversos setores
O debate prosseguiu com a participação e visão de áreas diferentes da medicina. “A SBPC/ML precisa trazer a discussão para o nosso setor”, disse o presidente da SBPC/ML, Wilson Shcolnik. “A ética é necessária porque o impacto na saúde é muito grande. Não há acesso nem serviços qualificados. Nossa população está desassistida.”
Para Claudia Cohn, as associações têm uma enorme responsabilidade: “Não é possível sair por aquela porta hoje sem ter a certeza que é preciso fazer alguma coisa”, disse, detalhando o processo complexo que envolve desde a escolha até o pagamento do serviço. “Quem paga não é o médico e quem escolhe não é o paciente. São vários atores, alguns deles pressionados. A linha reta é a indicação por uma questão técnica e não era isso que estava acontecendo.”
Para a organização, o evento foi um marco na história no setor de saúde: “Levantar o debate para o final do 52º Congresso da SBPC/ML foi uma atitude corajosa”, disse Carlos Eduardo Gouvêa, do IES e da CBDL. “Trazer a informação para o nosso mercado para combater a corrupção é fundamental. O instituto tem hoje 240 associados, representando os diferentes setores da indústria.” Gouvêa detalhou como funciona o IES e disse que recebeu cerca de 600 denúncias, com 1,5 mil denunciados, entre médicos, hospitais, laboratórios e instituições públicas.
“Perdemos muito tempo. As entidades médicas e instituições ficaram adormecidas e se achando autossuficientes para resolver as mazelas internas”, foi o diagnóstico do momento, feito pelo ex-presidente do CFM Roberto Luiz D’Ávilla. Para o médico, o número de denúncias em relação a incentivos e comissões, por exemplo, são raros, porque denunciantes e denunciados convivem muito bem.
D’Ávilla explicou que não é possível uma denúncia anônima ao CFM. “Posso afirmar que não há corporativismo. Os fatos são apresentados e o julgamento acontece. Os pacientes depositam confiança em nós e os interesses deles têm que estar acima de qualquer coisa”, que atuou também como corregedor do conselho.
“É preciso levar a discussão e o engajamento para a sociedade. Não adianta só discutir e propor ações aqui dentro de sala se não conseguirmos chegar à população”, enfatizou Ademar Paes Jr., presidente da ACM. Ele explicou que a transparência é necessária porque traz confiança às ações. Destacou o acesso à saúde como um dos principais problemas não só no setor público, mas também no privado. “Aliás, nenhum dos dois está funcionando direito.” Também mencionou a necessidade de dados para melhor avaliar a situação do país.
Wilson Shcolnik comentou que existem denúncias, mas também há dificuldades em relação a dados para decisões, e que esse fato precisa ser avaliado com atenção para que seja tomada uma atitude em benefício do paciente.
Luiz Fernando Barcelos, presidente da SBAC (Sociedade Brasileira de Análises Clínicas), disse que gostaria muito de estar indignado com as colocações no debate, mas o setor vivencia o problema. “Infelizmente, a corrupção existe. Tem como provar? Muito difícil conseguir”, lamentou. Ele explicou que o país vive um momento muito complicado na área de saúde e que em diversos momentos o médico precisa cercar-se de segurança, solicitando muitos exames, porque nunca viu o paciente antes nem sabe se verá uma segunda vez.
Shcolnik falou sobre a divulgação de informações nos Estados Unidos, com dados online na área de saúde disponíveis na internet (open payment), e que no Brasil, em Minas Gerais, existe uma lei similar de transparência, regulamentada por um decreto de 2017. “É preciso maior transparência entre médicos, indústria, distribuição de medicamentos e insumos. Não estamos fora disso. Precisaremos de leis federais para disciplinar?”, questionou o presidente da SBPC/ML.
Entre as conclusões dos participantes está a necessidade de educar, ser feito um trabalho conjunto de conscientização em todos os segmentos, com leis e sem impunidade.
“Estamos vivendo novos tempos. Que cada um de nós coloque a mão na consciência, contando com os esforços de todos para mudar o quadro no Brasil, que tanto corrói os nossos recursos”, finalizou o presidente da SBPC/ML.