Como reflexo, setor perderá a capacidade de investimentos no desenvolvimento de novos métodos de diagnósticos e terá serviços mais caros e menos acessíveis
1º de setembro de 2020
Com a Reforma Tributária tramitando no Congresso Nacional, o
setor de saúde reforça sua preocupação com os resultados de uma reforma fiscal
que, a princípio, não considera a função social da medicina diagnóstica no
conjunto de atividades relacionadas a saúde e bem-estar da população, deixando
assim de enxergar as especificidades de segmentos altamente estratégicos e
essenciais para a manutenção da sociedade. Estudo elaborado pela Associação
Brasileira de Medicina Diagnóstica (Abramed) elenca alguns cenários que a
reforma pode trazer para o atendimento assistencial. O principal deles está em
um possível aumento de até 40,4% na carga tributária de laboratórios e clínicas
de imagem.
A criação de um imposto único que, no Brasil, seria chamado
de CBS, sem considerar alíquotas diferenciadas ou mesmo isenção para setores
essenciais como saúde – a exemplo do que fazem países altamente desenvolvidos
como Austrália, Áustria e Canadá – pode dificultar ainda mais o acesso da
população brasileira ao diagnóstico e inviabilizar o desenvolvimento de novos
exames. Vale ressaltar, inclusive, que graças a essa capacidade, um conjunto
relevante de laboratórios nacionais conseguiu elaborar testes para detecção da
COVID-19 nesse momento de pandemia.
“O sistema tributário brasileiro é, de fato, disfuncional e
tem uma complexidade que contribui para a construção de um ambiente de negócios
pouco favorável a investimentos e empregabilidade. Precisamos de uma reforma
focada na simplificação dos processos com objetivo de reduzir, entre outros
entraves, o custo de conformidade. Porém, onerar ainda mais o segmento de saúde
inviabilizará a atuação de inúmeras empresas de medicina diagnóstica, que deixarão
de existir, especialmente em regiões menos desenvolvidas economicamente”,
comenta Priscilla Franklim Martins, diretora-executiva da Abramed.
Essa análise de que pode ocorrer aumento de até 40,4% na
tributação da saúde foi feita considerando o modelo sugerido pelo Ministério da
Economia que unifica o PIS/PASEP e Cofins sob uma alíquota única de 12%. “Ainda
que se proponha a adoção de um regime não cumulativo, em que despesas com
insumos são compensadas ao longo da cadeia, o setor será penalizado. Nossa
maior despesa é folha de pagamento e será inevitável a redução da
empregabilidade”, explica Fábio Cunha, diretor do Comitê Jurídico da Abramed.
Hoje, segundo dados do levantamento da Associação, a folha
de pagamento representa cerca de 50% das despesas de laboratórios e clínicas de
imagem, considerando contratações diretas e indiretas. Nesse sentido, na
ausência de uma negociação voltada à neutralidade e inspirada no modelo adotado
por grandes países, há a alternativa da desoneração da folha de pagamento, que
permitiria a manutenção dos serviços e o investimento em tecnologia e inovação
para a garantia do acesso dos brasileiros ao diagnóstico precoce e de
qualidade. Porém, essa opção encontra-se a cada dia menos viável, pois
demandaria a aprovação de um mecanismo de financiamento como, por exemplo, a
CPMF, que encontra forte resistência no Congresso.
Impacto social – Além do impacto direto nas operações
das empresas do setor de medicina diagnóstica, a Reforma Tributária não
considera a essencialidade de serviços como a saúde e traz um impacto direto no
custo assistencial geral, colocando o ônus sobre os cidadãos brasileiros.
Com carga tributária até 40,4% superior à atual, é
inevitável que haja repasse de preços para pacientes e operadoras de planos e
seguros de saúde. Isso levará a um aumento generalizado do valor dos serviços
pagos, tanto por pacientes particulares quanto na precificação das seguradoras,
que também serão obrigadas a repassar esses custos aos contratantes, sejam
empresas ou famílias.
Como resultado, caso esse cenário se confirme, o mercado de
saúde suplementar poderá experimentar uma nova redução do número de
beneficiários. Outra consequência é o aumento da demanda sobre o Sistema Único
de Saúde (SUS), que infelizmente não é capaz de atender grande parte da
população com equidade.
“Se antes de vivenciarmos a pandemia já nos preocupávamos
com a Reforma Tributária aumentando os custos e dificultando o acesso da
população ao diagnóstico, nesse momento em que o novo coronavírus também
desencadeou uma crise econômica levando milhões ao desemprego, o reflexo será
desastroso”, comenta Priscilla. Segundo a executiva, os planos de saúde já perderam
milhões de beneficiários nos últimos anos e esse número poderá crescer ainda
mais, uma vez que muitos beneficiários e empresas contratantes não suportarão
as mensalidades devido à instabilidade financeira pós-pandemia, e a reforma
pode fazer com que esses valores se tornem ainda menos suportáveis.
Para Cunha, a somatória dos resultados da COVID-19 à Reforma
Tributária levará a um cenário no qual a saúde pública, já sobrecarregada, terá
de atender a todos os cidadãos que não puderam permanecer com seus atendimentos
e procedimentos arcados pelo sistema suplementar, uma consequência bastante
indesejada do ponto de vista de orçamento público. “O setor de medicina
diagnóstica no Brasil visa a um alinhamento às melhores práticas internacionais
em benefício da população. Assim, é necessário que o Legislativo trabalhe para
ajustar a proposta garantindo a sobrevivência desses serviços tão essenciais ao
progresso e ao bem-estar dos brasileiros”, finaliza.