Abramed promoveu debate sobre a medicina diagnóstica no novo cenário das pesquisas clínicas

Abramed promoveu debate sobre a medicina diagnóstica no novo cenário das pesquisas clínicas

O encontro reuniu especialistas para abordar as perspectivas regulatória, médica e da indústria relacionadas à Lei 14.874/2024.

18 de fevereiro de 2025 – A Abramed realizou, em 11 de fevereiro, uma reunião conjunta do Comitê Técnico de Análises Clínicas e do Comitê de Governança, Ética e Compliance (GEC) para debater o papel da medicina diagnóstica no novo cenário das pesquisas clínicas. O evento, realizado em São Paulo, contou com a parceria institucional da Snibe Diagnostic e reuniu especialistas do setor para uma discussão aprofundada sobre as perspectivas regulatória, médica e da indústria.

O encontro contou com as apresentações de Analluza Bolivar Dallari, advogada especialista em Inovação e Tecnologia na Saúde, LGPD e Pesquisa Clínica; Karla Espírito Santo, chefe de Pesquisa Acadêmica de Modelos Descentralizados e Novos Ensaios do Hospital Israelita Albert Einstein; e Lucy Liu, vice-presidente de Negócios Internacionais da Snibe Diagnostic.

Logo após, aconteceu o debate, com Analluza, Karla e Carlos Eduardo Ferreira, líder do Comitê Técnico de Análises Clínicas da Abramed e gerente médico do Laboratório Clínico do Hospital Israelita Albert Einstein. A moderação foi de Sara Cepillo, consultora de Governança Corporativa do Grupo Fleury e líder do Comitê de Governança, Ética e Compliance da Abramed. “Convidamos diversas pessoas para falar de um tema que é multidisciplinar e interdisciplinar. Ficou muito claro que temos desafios regulatórios no Brasil, mas também muitas oportunidades”, disse.

A discussão abordou a regulamentação das pesquisas clínicas no Brasil. A Lei 14.874/2024 introduz um novo marco legal que complementa e atualiza as normas existentes, criando um Sistema Nacional de Ética em Pesquisa com Seres Humanos e definindo responsabilidades claras para pesquisadores e patrocinadores.

Apesar da sanção da lei, ainda não há mudanças práticas no setor. Segundo Analluza, o Brasil vive um momento de transição complexa, com dois sistemas coexistindo: o Sistema CEP/CONEP – conjunto de Comitês de Ética em Pesquisa (CEPs) e da Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (CONEP) – e o Sistema Nacional de Ética e Pesquisa, previsto na nova legislação, mas sem prazo definido para ser implementado.

“Tecnicamente, nada muda no momento. Estamos convivendo com dois ordenamentos jurídicos simultâneos, o que gera insegurança para a submissão de projetos, contratos e avaliação ética”, explicou. Mesmo com esse cenário de indefinição, a regulamentação plena da nova lei poderá trazer benefícios, como previsibilidade nos prazos e maior agilidade na aprovação de protocolos clínicos, acrescentou a advogada.

Tecnologia

A aplicação da inteligência artificial e o uso de dados coletados por dispositivos já fazem parte da rotina clínica, e sua expansão para a pesquisa é um caminho natural, segundo Carlos Eduardo Ferreira. “A descentralização já acontece na prática, com coleta domiciliar e modelos de devices para micro coletas. Embora haja desafios em relação à precisão dos dispositivos point-of-care, a tecnologia para automonitorização continuará avançando”, disse.

No entanto, ainda há receio em trazer essas inovações para a pesquisa clínica. Já são utilizados dados para identificar riscos cardiovasculares e apoiar diagnósticos na área de urologia, trazendo benefícios diretos aos pacientes. “É claro que garantir a confidencialidade e a precisão dos dados é fundamental. Hoje, a inteligência artificial já permite a leitura e interpretação de textos médicos, extraindo conclusões de artigos científicos de forma automatizada. Os profissionais que não dominarem essas ferramentas correm o risco de ficar para trás”, alerta Ferreira, destacando o desafio de regular um processo que já está sendo aplicado na prática.

Na pesquisa, a questão é um pouco diferente, como expôs Karla. “O paciente é responsabilidade do médico que o incluiu no estudo. Mas quando há a descentralização e ele realiza exames ou consultas sob cuidado de outro profissional, há dúvidas sobre como isso pode impactar na pesquisa”, destacou. O debate sobre essa questão já está sendo tratado por órgãos reguladores, como a FDA, que busca definir diretrizes mais claras para o modelo descentralizado, pensando no conforto para o paciente.

Sobre a inteligência artificial, Karla reforçou que a tecnologia é um caminho sem volta, mas precisa de parcimônia na área de saúde. “Diferentemente de outras áreas, na medicina é preciso validar cada passo antes de seguir adiante”, ressaltou. Ferramentas como ChatGPT já são úteis, mas há limitações. “Já vimos casos de IA inventando artigos e referências inexistentes, por isso, no setor médico, o uso deve ser criterioso e validado por especialistas antes de ser incorporado aos processos clínicos”, afirmou.

Analluza comentou que toda essa disrupção tecnológica é muito nova, tendo sido impulsionada na pandemia de Covid-19. Apesar de toda a tragédia humana vivida no período, a crise sanitária impulsionou a digitalização do setor, integrando novos atores – inclusive aqueles sem licença sanitária – ao ecossistema de saúde digital.

“As bases de dados cresceram e foram digitalizadas de forma acelerada, mas a regulamentação não acompanhou esse ritmo. Hoje, temos mais dados disponíveis, mas o sistema de saúde brasileiro continua fragmentado, o que dificulta a mineração e a transformação dessas informações em funcionalidade”, explicou.

A advogada também chamou atenção para a questão dos wearables (dispositivos vestíveis) e a lacuna regulatória existente. “Nem todos são dispositivos médicos. A própria RDC 657 da Anvisa abriu uma brecha, permitindo que softwares voltados para bem-estar não precisem de notificação nem registro. Isso resultou em milhares de aplicativos disponíveis no mercado sem testes de qualidade, desempenho ou eficácia”, alertou.

Para ela, a pesquisa clínica é essencial nesse cenário, garantindo segurança por meio da avaliação de comitês de ética. “A pesquisa clínica traz respaldo científico e ético para essas inovações. Cada estudo passa pelo crivo de um comitê de ética, que avalia os riscos e assegura o cumprimento das diretrizes de sigilo e consentimento livre e esclarecido”, afirmou.

Por fim, Karla acrescentou que os estudos descentralizados e a coleta por wearable ou aplicativo, bem como o uso da inteligência artificial atrelada a esses dispositivos são o futuro, mas ainda há barreiras, como a dificuldade dos pacientes em usar aplicativos e o tempo de adaptação dos médicos a novas ferramentas. “Essas inovações vieram para ficar, mas estamos na fase de aprendizado e há muitas questões ainda sem resposta”, expôs.

O evento reforçou a necessidade de um arcabouço regulatório mais claro para a pesquisa clínica, bem como a importância de integrar avanços tecnológicos de forma ética e segura. Com a inteligência artificial e os dispositivos vestíveis ganhando espaço, o desafio será equilibrar inovação e regulação, garantindo que os estudos clínicos evoluam sem comprometer a segurança dos pacientes.

“Um ponto importante a se considerar é que, para quem já atua no setor de saúde há algum tempo, não há uma grande necessidade de conscientização sobre a legislação de pesquisas clínicas. No entanto, quem está de fora muitas vezes não percebe o que já existia antes e quais são os desafios práticos e operacionais que enfrentamos. Não se trata apenas da implementação do ponto de vista regulatório, mas também da complexidade de lidar com duas legislações que, teoricamente, estão em vigor ao mesmo tempo”, finalizou Sara.

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