Desafios e possíveis ações para melhorar a saúde frente ao cenário econômico atual são temas do FILIS 2022

Desafios e possíveis ações para melhorar a saúde frente ao cenário econômico atual são temas do FILIS 2022

O orçamento público federal, a racionalidade no uso de recursos, a atenção primária, a tecnologia, a importância dos dados e da infraestrutura e a logística estiveram entre os temas abordados por lideranças internacionais e nacionais da saúde no módulo econômico do evento

Debater os principais desafios e obstáculos econômicos que permeiam o setor de saúde foi o objetivo de um dos painéis que aconteceram durante a sexta edição do Fórum Internacional de Lideranças da Saúde (FILIS), promovido pela Associação Brasileira de Medicina Diagnóstica (Abramed). Mediado pelo jornalista Sidney Rezende, o debate intitulado “Obstáculos econômicos frente aos desafios atuais” contou com a participação de Patricia Frossard, presidente Brasil da Philips; Roberto Santoro, CEO do Grupo Pardini; Maureen Lewis, CEO da Aceso Global; e Arthur Aguillar, diretor de Políticas Públicas do Instituto de Estudos para Políticas de Saúde (IEPS). O objetivo foi reunir diferentes visões sobre os pontos a serem observados e os aspectos do cenário econômico que podem ajudar a solucionar os principais desafios da saúde.

A saúde está em foco e a pandemia escancarou muitos obstáculos que até então estavam velados. Esse cenário, de acordo com Patricia, demanda discussões mais profundas sobre os entraves que permeiam o setor e por uma necessidade de os participantes da cadeia unirem-se em prol do paciente. A junção de esforços dos setores público, privado e da própria sociedade são, para ela, fundamentais, assim como os investimentos no engajamento do paciente e em PPPs (parcerias público-privadas), que, além de permitirem a consolidação de indicadores (KPIs), ajudam na redução de custos, no ganho de escala e no aprimoramento da efetividade no cuidado com o paciente.

“Pecamos na comunicação de massa para ensinar o paciente sobre quando ele deve procurar o hospital, em que momento ele tem que se submeter a um procedimento, entre outros. Embora eu veja essa consciência naturalmente acontecendo por conta da pandemia. Ainda esquecemos do paciente e de sua educação.”

Trazendo para o contexto da indústria, ela apontou a necessidade de solucionar o desafio de acompanhar o avanço, atender bem o paciente, com qualidade e, ao mesmo tempo, a baixo custo. Por isso, cada vez mais os produtos desenvolvidos consideram acompanhar toda a jornada do paciente, desde a entrada na recepção do serviço de saúde até o procedimento de diagnóstico, o tratamento e, eventualmente, o home care.

“Quando conseguimos participar de todo esse processo, conseguimos ajudar os hospitais e laboratórios a fazer uma gestão melhor de toda a sua cadeia, de forma que eles tenham menos perdas, seja de tempo, seja repetição de exames”, enfatizou Patricia.

A sofisticação das tecnologias, como a inteligência artificial, que ajuda a aprimorar o diagnóstico, também é útil e emerge como parte importante nessa busca da transformação. “Os gargalos existem, mas contamos com a IA, por exemplo, para melhorar a eficiência. Isso ainda é algo embrionário e que pode ser muito explorado, principalmente no que diz respeito ao diagnóstico.”

Do âmbito de políticas públicas, o diretor do  IEPS contextualizou que trazer a lente da economia, considerar a evidência empírica em políticas públicas para compreender os desafios do SUS e tentar resolvê-los da melhor maneira possível são objetivos da instituição. Para ele, ampliar o orçamento público de saúde, fazer melhor uso desses recursos e identificar possíveis fontes de origem desse incremento de receita, sobretudo em um momento como o atual, em que o cenário fiscal do país está complexo, são prioridades. “Seria irresponsável falar de mais gastos públicos, sem esclarecer como podemos fazer isso”, ressaltou.

Outro desafio apontado por Aguillar está em direcionar os investimentos à atenção primária, que, segundo ele, é mais custo-efetivo na saúde pública: “Na estratégia de saúde da família, que é uma política reconhecida, premiada e com as melhores evidências em periódicos científicos, mas que parou de crescer nos últimos oito anos, depois de um aumento de cobertura sistemático desde os anos 1990.

Usando como base uma nota técnica publicada pelo IEPS, que analisou o projeto de lei orçamentária para 2022, o especialista explicou que, olhando o orçamento público federal em saúde e descontando os gastos com a covid-19, trata-se do menor orçamento em dez anos para o setor. Além disso, o gasto em atenção primária está praticamente estabilizado, mesmo tendo um incremento importante da população nesse período. O outro ponto destacado é que o nível de investimento do governo caiu 70%.

“Nosso sistema de saúde tem diversas pressões de demanda, inflação médica, represamento de serviços advindos da covid-19, envelhecimento da população, afinal estamos em plena transição democrática, com um sistema que não está mudando seu patamar de financiamento. Temos também um momento muito complicado fiscal.”

Exatamente por esses motivos, o IEPS, na Agenda Mais SUS – documento da instituição para a eleição presidencial, propõe uma trajetória incremental do aumento de gastos públicos com saúde, saltando de 3,95% para 5% do PIB até 2026. Essa meta é considerada por ele exequível, quando observada a estrutura do orçamento. A saída apontada está em introduzir medidas para reduzir ou eliminar renúncias fiscais que o setor apresenta. Em 2018, o montante foi de 50 bilhões de reais, e, desse total, 26 bilhões em renúncias de imposto de renda das pessoas físicas e jurídicas. No caso da pessoa física, 80% desse montante está relacionado a 10% da parcela mais rica da população. “Parar de subsidiar a saúde das pessoas mais abastadas na saúde suplementar e colocar esses recursos no sistema público de saúde talvez seja o primeiro passo.”

A segunda ação proposta é olhar para outros entes de governo. Ele citou o exemplo do Ceará, que acabou de triplicar a parte do ICMS repassada para os municípios, condicionando tudo ao valor agregado e aos resultados obtidos. Também faz parte das proposições olhar para todos os bens e serviços que fazem mal para a saúde e aumentar a tributação desses setores para financiar a saúde pública. É o caso de bebidas açucaradas, alimentos ultraprocessados, álcool e tabaco.

O CEO do Grupo Pardini, organização presente em diferentes regiões, apontou questões de infraestrutura como um obstáculo, que inclusive está diretamente relacionado à logística, um problema na saúde de forma geral no Brasil. É preciso solucionar essas questões e aumentar a capacidade de transitar, como no caso da instituição, exames laboratoriais, e não os clientes, solucionando uma questão importante, que é dar acesso a exames cada vez mais especializados e de qualidade, em localidades remotas.

“Se um recém-nascido nas entranhas maranhenses precisa de um diagnóstico de uma doença rara, isso tem que ser feito de uma forma rápida. Mas não lá. Tem que ser transportado para e por um laboratório de referência que forneça essa solução imediata. Quando olhamos para o quesito infraestrutura, é extremamente importante saber como se pode prover isso”, ressaltou.

Santoro reforçou não só a ideia colocada por outros participantes, que é a necessidade do foco em atenção primária no sistema de saúde, como também a relevância da medicina diagnóstica nesse contexto. “Hoje o setor representa 20% dos gastos na saúde suplementar. Mas, se associada à atenção primária, ela é muito mais resolutiva. O volume de exames feitos na rede pública equipara-se ao da saúde privada. Os exames estão acontecendo, mas sem ligação com atenção primária. Se formos falar em economia, gastos com hospitalização e outros custos também evitáveis, é preciso dar mais visibilidade à medicina diagnóstica. Penso que, inclusive, os resultados disso precisam ser medidos”, explica.

A necessidade de se rediscutir o modelo de saúde, a exemplo do que aconteceu na criação do SUS, é também uma urgência apontada pelo executivo, assim como a inclusão digital, que, apesar dos avanços, segue sendo uma barreira. Em sua fala ao longo do debate, Santoro também enfatizou várias vezes a necessidade de preparar profissionais, inclusive para lidar com as tecnologias, e de ser criada uma trilha de carreira para os profissionais no sistema público de saúde. “Esse é um momento adequado de realizar uma nova discussão setorial, fomentada pelo governo para podermos realmente atingir um novo patamar. Nenhuma transformação de saúde acontecerá sem transformação digital e utilização de tecnologia.”

Trazendo a visão internacional desses desafios, Maureen acredita que a carência do uso de dados para embasar a gestão, assegurar a qualidade e melhorar a eficiência deve ser prioridade quando o assunto é saúde. Existe a necessidade de um novo enfoque em qualidade, tema que está diretamente relacionado, segundo ela, a todos os outros desafios apontados durante o debate. “Dados são importantes para saber como tudo está funcionando e o que deveria ser mudado. Não se pode alcançar qualidade sem isso”, explica.

A própria configuração da saúde no Brasil foi salientada como um ponto de atenção, pois não há integração entre os sistemas público e privado e também dos serviços. Em sua concepção, o cenário ideal não seria falar de quem está prestando o serviço, e sim do resultado alcançado. Essa descentralização do cuidado e a existência de uma série de atores fazem o paciente se perder em sua jornada por não saber o que deve fazer.

“A gestão é fraca tanto na saúde suplementar como no sistema público. O uso de dados e os ajustes que eles permitem são fundamentais para a saúde de forma geral. Isso é muito interessante para acompanhar se houve melhora e para criar políticas. O tempo é agora e existe uma abertura para as PPPs, inédita, que é bastante animadora. Lembrando que o Brasil está à frente dos países emergentes”, enfatiza.

Maureen também trouxe a necessidade de se pensar em aspectos que ajudem a melhorar a eficiência e a qualidade do atendimento, apontando mais uma vez a atenção primária e a prevenção como caminhos bem-sucedidos.

A CEO da Aceso Global também foi palestrante no sexto FILIS. Confira aqui a matéria sobre sua apresentação.

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