Organizações precisam estar preparadas para antever riscos e reduzir prejuízos
11 de Maio de 2020
A
volatilidade e as incertezas geradas por crises no mundo dos negócios podem,
rapidamente, diluir as estratégias, os resultados, os ativos e a reputação das
empresas. Estar preparado para esses momentos e, sobretudo, agir com velocidade
e assertividade pode ser uma das poucas alternativas para a sobrevida das
organizações durante e após períodos de crise.
Para
Wanderson Jacinto, gerente de Auditoria Interna, Riscos e Compliance da
Beneficência Portuguesa de São Paulo (BP) e membro do Comitê de Governança, Ética
e Compliance (GEC) da Associação Brasileira de Medicina Diagnóstica
(Abramed), antes de tudo, é fundamental distinguir o que são desafios e
situações do dia a dia, problemas, incidentes e crises. A diferença entre eles
se dá pela complexidade do evento e pela dimensão do impacto nos negócios. “As crises
têm características de maior dificuldade e incerteza, soluções são menos explícitas
ou óbvias e impactos financeiro, operacional, legal e reputacional são
realmente significativos. Por esta definição é possível dimensionar e imaginar
o risco para as empresas que não se preparam e respondem adequadamente aos
momentos de adversidade”, explica.
No
âmbito corporativo, gerenciar crises refere-se ao esforço coordenado e
estruturado que objetiva a redução de prejuízos e impactos em momentos de
disrupção, sejam eles causados por motivadores internos ou externos. E a
pandemia do novo coronavírus jogou luz sobre uma fragilidade importante e
cultural de parte das empresas brasileiras: antever riscos e responder
rapidamente a adversidades. “Seguir um passo a passo claro e objetivo para o gerenciamento
de crises é importante para que a tarefa não se torne mais uma preocupação ou um
gatilho que desencadeie novos incidentes ou novos problemas institucionais”,
argumenta Jacinto.
Primeiramente,
para ele, deve-se encarar que a crise é real, requer medidas extraordinárias e
atenção não usual, além de tranquilidade para a tomada de decisões assertivas
que não aumentem ainda mais os custos e as despesas durante o período de
adversidades e enfretamento de problemas.
O
segundo passo é criar e empoderar um comitê multidisciplinar para desenhar as
ações de enfrentamento à crise, responsável por recomendar ou, a depender da
governança e autonomia estabelecida, aprovar medidas e ações a serem
implantadas. “As crises desafiam as estratégias, as dinâmicas e os processos
definidos, por isso é fundamental definir os papéis e as responsabilidades dessa
comissão e de seus integrantes, além de decidir se o grupo atuará de forma estratégica
ou terá extensão tática e operacional na implantação das ações”, esclarece o
gerente da BP.
Outro
fator muito importante na criação e atuação deste comitê é a velocidade com que
ele irá trabalhar e sua composição. Jacinto sugere a participação de profissionais
de recursos humanos, financeiro, jurídico, suprimentos, compliance,
operações e de outras áreas, se houver necessidade e a depender do tamanho da
estrutura organizacional. Cabe ao comitê a análise dos cenários e proposição de
estratégias para gerenciar o período de crise.
A
periodicidade com que o comitê vai se reunir também é importante para que
discussões ocorram e decisões sejam tomadas tempestivamente. Para tanto, devem
ser mantidas agendas diárias que atualizem os temas relevantes e definam as próximas
ações.
A
análise rápida dos cenários que a crise provoca na organização e brainstorming de soluções estratégicas criativas
para diminuir a exposição da empresa é o terceiro passo, na visão de Wanderson Jacinto.
“O foco precisa estar no núcleo do negócio, mas sem esquecer que crises
provocam impactos permanentes na sociedade, mudam hábitos de consumo, preferências,
adicionam e excluem concorrentes e fornecedores, mudam a relação de trabalho”,
alerta, lembrando que, para garantir a sustentabilidade da empresa, é
necessário adotar-se visão de médio e longo prazos para o enfrentamento da
crise, e não apenas ações imediatistas.
A
natureza e a abrangência do escopo das discussões da comissão multidisciplinar,
explica o gerente da BP, dependerão de senioridade, conhecimento técnico e
autonomia atribuída ao grupo. Sendo assim, é possível avaliar a contratação de especialistas
ou consultorias para apoio pontual ou integral no gerenciamento da crise. “Uma
dica interessante é a possibilidade de contratação de consultorias remuneradas
pela modalidade success fee, na qual
o contratado é remunerado apenas quando há ganho financeiro evidenciado e
mensurável pelas ações sugeridas”, recomenda Jacinto.
Agilidade
nas ações
Assim
como as decisões, a implementação das ações precisa de celeridade e
tempestividade para saírem do papel, pois, em períodos de crise, os cenários e
os riscos mudam constantemente e rapidamente, e a solução criativa de ontem
pode ser obsoleta amanhã. Esse é o quarto passo no gerenciamento de crise para
o gerente da BP e membro do GEC da Abramed.
Uma
importante ferramenta para monitorar a efetividade e assertividade das ações é
a criação e o acompanhamento de indicadores e métricas por meio de painéis para
monitorar os resultados. “Além de facilitar a condução de discussões e
reuniões, tangibilizar os problemas e medir o sucesso das ações implementadas,
os indicadores permitem mensurar a evolução do impacto da crise no negócio ao
longo do tempo, ou seja, como a empresa está, de fato, passando pela adversidade”,
explica Wanderson Jacinto.
A
criação e manutenção de um plano robusto de comunicação é mais uma etapa importante
no processo de gerenciamento de crise e é fundamental que ele seja implementado
desde o início. Em épocas de incertezas e turbulências é comum que haja
desalinhamento entre acionistas, colaboradores, fornecedores, clientes e
credores, assim, na era de fake news,
redes sociais e compartilhamento em massa, segundo Jacinto, é primordial
garantir que apenas informações íntegras e estratégicas indiquem o
posicionamento da empresa, a situação atual real e as projeções futuras. “Como
qualquer plano de comunicação, este precisa ser claro, objetivo, customizado
para cada público, inclusive o interno (colaboradores e terceiros), bem como possuir
formas de garantir que a mensagem foi repassada sem ruídos ou interpretações
equivocadas”, destaca o gerente. Para ele, caso não se tenha definido um porta-voz
da instituição, este é o momento para nomeá-lo.
O último
passo da gestão de crise refere-se ao plano de recuperação pós-crise. “A
história nos mostra que a única certeza possível durante o período difícil é
que, em algum momento, tudo vai passar. Por isso, não se pode negligenciar o momento
pós-crise para não comprometer a rentabilidade e a sustentabilidade do negócio”,
ressalta Jacinto.
A proposta é um plano de recuperação que pode ser direcionado pelo próprio comitê de gerenciamento de crise. Desenho de planos para alavancagem financeira, retomada operacional, análises forenses e auditorias internas para identificação de desvios ou revisão de processos, respostas satisfatórias a reclamações de clientes, resolução de litígios e de eventuais questionamentos ou fiscalizações de reguladores, planos de sucessão e revisão de quadro de colaboradores são alguns dos exemplos de ações propostas pelo gerente da BP. Mantendo a calma, entendendo o momento oportuno de agir e cumprindo essas etapas, Wanderson Jacinto acredita que é possível auxiliar seu negócio a responder de forma mais assertiva e precisa à volatilidade e às incertezas geradas por uma crise. Ele também acha imprescindível avaliar as lições aprendidas, os erros e os acertos durante o enfrentamento das adversidades. “Assim é possível desenvolver o seu próprio passo a passo para gerenciar eventuais futuras crises, elaborando e implementando uma política ou um procedimento customizado e alinhado com a natureza, a complexidade e o tamanho do seu negócio”, finaliza.