O diagnóstico no contexto da segurança do paciente

O diagnóstico no contexto da segurança do paciente

Wilson Shcolnik, presidente do Conselho de Administração da Abramed, falou sobre a importância da medicina diagnóstica em webinar promovido pelo Proqualis

16 de julho de 2020

A segurança do paciente também depende da excelência da medicina diagnóstica. A fim de debater esse assunto, o Proqualis, que produz e dissemina informações e tecnologias em qualidade e segurança do paciente, promoveu, no dia 15 de julho, um webinar com a participação de Wilson Shcolnik, presidente do Conselho de Administração da Associação Brasileira de Medicina Diagnóstica (Abramed).

O evento virtual, que também contou com a participação de Lucas Zambon, diretor científico do Instituto Brasileiro para Segurança do Paciente (IBSP), e foi moderado por Maria de Lourdes de Oliveira Moura, da assessoria técnico-científica do Proqualis, abordou como os erros em diagnóstico ocorrem e quais os melhores caminhos para evitá-los. Os especialistas também entraram no contexto do diagnóstico relacionado à COVID-19.

Todos os anos, o Emergency Care Research Institute (ECRI) divulga uma lista com as prioridades para manutenção da segurança do paciente e, em 2020, atrasos e falhas no diagnóstico assumiram o topo do ranking como a principal preocupação. “A previsão é de que todos nós sofreremos ao menos uma vez na vida um atraso ou uma falha no diagnóstico de alguma patologia”, comentou Shcolnik baseado em dados publicados no relatório Improving Diagnosis in Health Care do Instituto de Medicina dos Estados Unidos.

Enfatizando que nem sempre a falha está relacionada à displicência dos profissionais de saúde, Shcolnik declarou que são diversos fatores que podem levar à raciocínios imprecisos. “Médicos são humanos, se deparam com casos clínicos e têm a função de diagnosticá-los, paralelamente temos pacientes com limitações que, por muitas vezes, não conseguem descrever com precisão seus sintomas e não sabem se comunicar adequadamente”, explicou sobre essa via de mão dupla na qual cada componente envolvido em todo o processo contribui para um cuidado de saúde satisfatório.

Complementando esse pensamento, Lucas Zambon, durante sua palestra, trouxe uma explicação prática sobre o raciocínio do profissional médico. “Temos duas formas de pensar e a mais rápida e intuitiva delas chamamos de heurística, que representa os nossos gatilhos, percepções e decisões ágeis. O lado ruim desse raciocínio é que nem sempre ele nos leva a conclusões corretas”, esclareceu antes de apresentar todos os vieses cognitivos à que o médico está exposto.

O presidente da Abramed também falou sobre os conceitos de overuse e underuse que por tantas vezes permeiam os debates do setor e apresentou um estudo sobre o cenário de testes laboratoriais inadequados que afirma que, em média, as evidências disponíveis sugerem que a subutilização é mais prevalente do que a superutilização (44,8% versus 20,6%). “Existem situações que temos os exames disponíveis para diagnóstico e eles deixam de ser utilizados por diversas razões que podem ser a falta de cobertura do plano de saúde, a falta de acesso daquele cidadão ao teste e até o desconhecimento do médico”, esclareceu.

Diagnóstico na pandemia de COVID-19

A relevância do diagnóstico nas infecções causadas pelo novo coronavírus não ficou de fora do debate. Para Wilson Shcolnik, da Abramed, em um cenário de pandemia na qual a infecção traz sintomas em sua maioria comuns, é natural que o médico ao receber um paciente com febre e tosse logo imagine que se trata de um caso de COVID-19. Porém as outras patologias – e os outros sintomas – não devem ser descartados.

O presidente, que é médico patologista, aproveitou para enfatizar conceitos laboratoriais que devem sempre ser compreendidos para a melhor escolha diagnóstica. Além de explicar o que é a sensibilidade e a especificidade de um teste, ou seja, a probabilidade daquele teste dar falso negativo e falso positivo, Shcolnik falou sobre o valor preditivo.

“O conceito de valor preditivo positivo e preditivo negativo traz um novo ator para a interpretação dos exames chamado de prevalência da doença na população”, disse ao explicar que quanto maior a prevalência e maior a especificidade, maior o valor preditivo positivo, cenário que estamos vivendo no atual momento da pandemia no Brasil onde a curva de contaminação segue alta em muitas regiões.

Shcolnik também aproveitou a oportunidade para reforçar que o teste molecular RT-PCR, que detecta o RNA do novo coronavírus nas amostras nasofaríngeas dos pacientes, segue como o padrão ouro para diagnóstico da COVID-19 e que resultados falsos negativos nesse exame estão normalmente atrelados à baixa qualidade da amostra que pode ter sido colhida de forma inapropriada, mal manipulada ou mal transportada. “Swabs que não forem bem conservados, ou seja, que não estejam refrigerados ou, após 72h da coleta, congelados, podem gerar resultados falso negativos”, pontuou.

Na sequência, ao explicar sobre os exames sorológicos, Shcolnik apresentou um estudo do The British Medical Journal que aponta como os métodos sorológicos têm diferenças significativas de sensibilidade e especificidade. A publicação analisou 24.842 exames e compara três metodologias sorológicas: ELISA, LFIA (que envolve os testes rápidos) e Quimioluminescência.

Em pacientes comprovadamente infectados com o novo coronavírus e submetidos à testagem sorológica, o resultado mais confiável foi o obtido através da quimioluminescência, diante do qual 98% dos resultados foram corretos. Já o método ELISA apontou anticorpos em 84% dos testes e a metodologia LFIA, dos testes rápidos, conseguiu identificar anticorpos em apenas 66% dos pacientes que já tinham sido infectados.

Relembrando que alguns países europeus já deixaram de recomendar os testes rápidos como alternativa de diagnóstico durante a pandemia devido à sua alta variabilidade, o executivo mencionou que no Brasil já tínhamos vivenciado uma experiência parecida com testes para detecção do HIV e que, para evitar repetição deste cenário no país, associações de medicina diagnóstica nacional se uniram à laboratórios privados em um projeto de validação de kits para COVID-19.

Shcolnik se referia ao Programa de Avaliação de Kits de Diagnóstico para Sars-Cov-2, uma iniciativa da Abramed em parceria com a Câmara Brasileira de Diagnóstico Laboratorial (CBDL), a Sociedade Brasileira de Análises Clínicas (SBAC) e a Sociedade Brasileira de Patologia Clínica e Medicina Laboratorial (SBPC/ML) que utiliza as estruturas de grandes laboratórios nacionais para avaliar diversos kits de testes para COVID-19, disponibilizando os resultados no portal testecovid19.org.

Lidando com uma doença nova

Saindo do setor laboratorial para tratar do diagnóstico clínico, Lucas Zambon, do IBSP, reforçou que o cenário de crise intensifica percepções equivocadas por parte dos especialistas. “Temos uma doença nova entrando na mente do médico. Porém, junto com ela, há um gap de informação, a pressão do tempo e o medo da contaminação, fatores que levam o profissional a tentar agir de forma muito ágil”, declarou.

Para o especialista, o diagnóstico clínico da COVID-19 encara dois tipos de erros principais: o erro por desconhecimento da doença, que ocorria principalmente no início da pandemia, e o erro por conta de apresentações atípicas da patologia como, por exemplo, indivíduos com ausência de sintomas respiratórios porém com anosmia e sintomas do trato gastrointestinal, além de possível AVC ou embolia pulmonar.

Por ser uma doença nova, a falta de compreensão que ainda persiste sobre o comportamento do novo coronavírus no organismo humano também impacta a interpretação dos exames. Para Shcolnik o momento é crítico. “Há pessoas que fazem o RT-PCR uma semana antes de apresentar sintomas e o resultado já é positivo. Além disso, existem indivíduos nos quais o exame molecular segue com positividade até dois meses após a sintomatologia. E ainda não temos certeza do que isso representa, se essa pessoa ainda está com o vírus replicando, o que seria uma ideia de transmissibilidade, ou se ela apenas tem partículas não replicantes”, detalhou.

Zambon finalizou o webinar enfatizando que a figura do médico representa duas atividades principais: diagnosticar e propor uma terapia. E que é importante reconhecer que os computadores e a inteligência artificial estão a cada dia mais presentes, otimizando as análises e trabalhando em prol da segurança do paciente, afinal “os computadores vão ajudar os médicos a diagnosticar melhor, visto que é pouco provável que a máquina sofra com algum viés cognitivo”.

Clique AQUI para assistir ao webinar completo.

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