Consultas públicas abertas pela Anvisa buscam opinião da sociedade sobre a realização de exames laboratoriais em farmácias e drogarias; Abramed mostra preocupação com a segurança dos pacientes
27 de outubro de 2020
A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) abriu
duas Consultas Públicas (CPs) visando ouvir a sociedade brasileira quanto à
realização de exames laboratoriais em farmácias e drogarias. Porém, a falta de
definição de quais deles poderão ser realizados fora dos ambientes altamente
controlados dos laboratórios clínicos é o que preocupa a Associação Brasileira
de Medicina Diagnóstica (Abramed). Hoje, farmácias e drogarias estão autorizadas
a realizar apenas testes rápidos de COVID-19 e de glicemia.
“A história nos mostra que muitos testes rápidos têm
desempenho ruim, o que pode levar a resultados incorretos, imprecisos, e à
falta de segurança dos pacientes”, explica Wilson Shcolnik, presidente do
Conselho de Administração da Abramed. O executivo, médico patologista clínico,
reforça que os laboratórios contam com profissionais altamente treinados para operação
de modernos equipamentos de classe mundial em ambientes controlados que seguem
diretrizes rígidas impostas pela regulamentação atual, contribuindo para a
obtenção de resultados confiáveis. “Exames realizados em laboratórios contam
com profissionais que estudaram a calibração, a validação e o controle de
qualidade desses equipamentos”, diz. “De que adiantaria uma moderna aeronave
sem um piloto treinado para operá-la?”, complementa.
Segundo o presidente, a maioria dos testes rápidos – também
denominados point-of-care testing (POCT) – não passa por avaliação da
Anvisa antes de ter a utilização liberada. “Eles são registrados, porém não são
validados. Cabe, assim, aos laboratórios, com toda sua expertise, realizar uma
análise qualitativa dos dispositivos antes de analisar amostras colhidas de
pacientes”, disse.
Foi o que ocorreu agora durante a pandemia do novo coronavírus.
Com muitos testes chegando ao mercado, começaram a surgir os resultados tanto
falso positivos quanto falso negativos. A fim de sanar esse problema, diversos
laboratórios privados e entidades do setor de saúde se uniram em um projeto objetivando
verificar o desempenho dos kits disponibilizados em território nacional. Os resultados
provenientes de cerca de 15 mil amostras de pacientes analisadas evidenciaram
problemas e estão disponíveis ao público.
Na visão da Abramed, a oferta de exames em farmácias e
drogarias pode ser positiva, desde que haja regulamentação limitando a
liberação apenas daqueles de baixa complexidade, à semelhança do que vem
ocorrendo em diversos países. “A Inglaterra, por exemplo, só autoriza testes
para controle de glicemia, colesterol, gripe e hepatite nas farmácias. Além da
glicemia, a França autoriza a exames para influenza A e B e estreptococos. Já a
Escócia permite apenas testes de gravidez e de HIV”, esclarece o presidente.
Para a Associação, é possível ampliar o acesso sem prejudicar
a segurança dos pacientes. Exames laboratoriais embasam até 70% das decisões
médicas, tamanha sua relevância no diagnóstico, na definição de tratamentos e no
gerenciamento de doenças. Por esse motivo, liberar qualquer tipo de teste
rápido em farmácia pode acarretar sérias consequências aos pacientes. “Um exame
com resultado impreciso, pouco confiável, não é benéfico à sociedade. Não
adianta ampliarmos o acesso aos exames, se os médicos não terão confiança
naqueles resultados para escolherem a melhor abordagem no cuidado do paciente”,
diz Shcolnik. Além disso, há a preocupação com os resultados críticos, ou seja,
que exigem intervenção médica imediata.
As consultas públicas que tratam o assunto são a 911 e a 912,
que seguem abertas no portal da Anvisa até 7 de dezembro. Hoje, os laboratórios
clínicos são regulados pela RDC 302, que impõe rigorosas recomendações
sanitárias. “Essa resolução representou um marco na conquista da qualidade dos
serviços laboratoriais no Brasil. Caso as farmácias passem a realizar exames,
devem seguir a mesma regulação dos laboratórios, até porque são esses rígidos
protocolos que garantem a segurança e a confiabilidade dos resultados”,
finaliza Shcolnik.