Atenção ao compliance também é necessária para o sucesso dos negócios
10 de outubro de 2020
Para fortalecer seu posicionamento
no mercado, ampliando o potencial do negócio, muitas empresas, inclusive na
área da saúde, vêm apostando em iniciativas de fusão e aquisição (M&A).
Embora seja promissor, esse tipo
de operação requer uma série de cuidados e processos, que são fundamentais para
assegurar o sucesso da operação e, principalmente, resguardar o comprador da
empresa-alvo (target firm) de possíveis dificuldades e prejuízos por
conta de multas decorrentes de práticas de corrupção, fraudes ou violação de
legislações, por exemplo.
Para tanto, é necessária uma série de diligências investigatórias
na etapa que antecede a M&A. A due diligence tem a função de
levantar e auditar informações técnicas, contábeis, fiscais, além de jurídicas
da empresa-alvo relacionadas às esferas trabalhistas, societárias, ambientais,
imobiliárias, de propriedade intelectual, administrativas, dentre outras,
conforme o caso. Para Walquiria Favero, superintendente jurídica e Compliance
da Dasa e membro do Comitê de Governança, Ética e Compliance (GEC)
da Associação Brasileira de Medicina Diagnóstica (Abramed), “o propósito é
determinar os riscos relacionados a eventuais comportamentos adotados por
representantes da empresa a ser adquirida em suas relações com os entes
públicos e privados, levantar todos os fatores que possam contribuir
positivamente ou negativamente para o sucesso do projeto, como um diagnóstico
de riscos e oportunidades. Dessa maneira, a operação terá mais confiabilidade e
capacidade de alcançar os objetivos esperados pela empresa compradora”.
Além disso, a due diligence tem um papel-chave no auxílio
dos negócios e na tomada de decisões dos gestores por dar subsídio para a
execução de melhorias e medidas de governança e boas práticas para que o
retorno dos investimentos realizados seja ampliado.
É a partir desse processo investigativo que a empresa interessada
na aquisição poderá equilibrar os riscos identificados e, por meio de exigência
do contrato de compra e venda (Sales and Purchase Agreement – SPA),
estabelecer disposições que lhe protejam em caso de futura responsabilização
por atos de corrupção ou antieconômicos praticados anteriormente à operação.
A atenção ao compliance também é mais do que
necessária, ainda mais que, com a globalização, as transações das empresas
ultrapassaram os territórios e as fronteiras. Entretanto, apenas a adoção de práticas
para cumprir normas legais e regulamentares, políticas e diretrizes
estabelecidas para as atividades da instituição ou da empresa não são suficientes
para o sucesso de uma organização.
Para Walquiria, é importante implementar um programa
de compliance que esteja em constante atualização, visando preservar a
conformidade ética e jurídica dos comportamentos adotados pela companhia,
especialmente nas relações mantidas com entes públicos – seja na área em
processos licitatórios, na contratação de terceiros que mantenham interação com
órgãos públicos, no recebimento de fiscalizações, nas políticas da empresa para
doação eleitoral, concessão de doações, brindes e patrocínios –, bem como deve
ser garantido os aspectos relativos a conformidade com a Lei Geral de Proteção
de Dados Pessoais. “A implementação exitosa de uma política de compliance
é uma tarefa sobremaneira complexa. Requer desde um código de ética, padrões de
conduta e treinamentos periódicos dos funcionários até o estabelecimento de
canais abertos e seguros para a denúncia de irregularidades, a garantia da
independência da instância responsável por aplicar as medidas disciplinares, de
registros contábeis íntegros e transparência nas doações com caráter político”,
explica.
Por mais que represente um objetivo que demanda grande dispêndio
de energia e de recursos, a efetiva adesão dos colaboradores à política de compliance
da companhia é indispensável para o desempenho regular das atividades
empresariais e uma condição relevante – por vezes, até indispensável – no caso
de uma operação de M&A, pois auxilia a identificar falhas de práticas e
condutas que possam existir na companhia-alvo, possibilitando a estruturação de
mecanismos jurídicos que mitiguem o risco de responsabilização da empresa
adquirente. “Uma análise panorâmica sobre o compliance aplicado às
operações de fusão e aquisição revela como é avançado o grau de relevância das
políticas de integridade para o sucesso dessas operações societárias”, destaca a
advogada.
Dessa forma, os riscos relacionados às eventuais práticas em
desconformidade com a política de compliance poderão ser devidamente
quantificados e equilibrados no contrato. Em algumas hipóteses, condições
antecedentes à operação poderão requerer até a prévia celebração de ajustes com
os órgãos de controle, com um acordo de leniência – acordo administrativo por
meio do qual o ente público, em troca da obtenção de vantagens materiais e
processuais, ameniza, por substituição definitiva e consensual, as penalidades
civis e administrativas que seriam eventual e oportunamente por si aplicadas ou
requeridas contra a empresa colaboradora.
Walquiria lembra que o adquirente é sucessor dos direitos e
obrigações da empresa target. Ainda que sob o ponto de vista criminal a
conduta seja respondida por quem efetivamente praticou o ato ilícito, o comprador
será sucessor de processos civis e administrativos.
Essas medidas de precaução, segundo a advogada, diminuem os riscos
de que a empresa adquirente seja surpreendida com a responsabilização por atos
e fatos anteriores à aquisição. Mas é preciso avaliar se essas eventuais
práticas não violam a Lei Anticorrupção (lei nº 12.846/2013), que disciplina a
responsabilidade de companhias que se submetem a uma operação de M&A.
A referida lei prevê a responsabilização das
empresas independente de culpa – no âmbito administrativo e civil – em virtude
de atos de corrupção praticados por terceiros em seu benefício ou interesse. Destaca-se
que para a configuração da responsabilidade da empresa adquirente, basta que ela
seja beneficiada com o ilícito cometido pelo terceiro, e mesmo que os gestores
desconheçam a prática de corrupção, serão responsabilizados.
Isso mostra, mais uma vez, que para diminuir riscos
é necessário que qualquer empresa, independentemente do porte ou segmento,
adote a due diligence como critério de confirmação de efetividade do
programa de integridade, como previsto no decreto federal nº 8.420/2015, que
regulamentou Lei Anticorrupção.
Mas, a superintendente jurídica e Compliance
da Dasa alerta que apesar das obrigações
quanto à realização da prática de diligência em operações de fusão e aquisição
constarem no normativo, foi mencionado que o legislador é que regularia como
isso se operacionalizaria em M&A de pequenos e médios negócios, o que não
foi feito até o momento. “Na saúde isso é uma incógnita, pois como o setor é
formado majoritariamente por pequenas empresas e está passando por um processo
de consolidação, a aplicação de medidas como previstas na lei torna a operação
de fusão e aquisição custosa e pode não refletir o risco real da operação”,
esclarece.
Para tanto, Walquiria orienta que seja
feita uma verificação de antecedentes da target firm, dos acionistas e
diretores; análise das doações para campanhas eleitorais; se a sociedade possui
Programa Especial de Parcelamento (PEP) em posição relevante e contratos
públicos, especialmente de licitações. A verificação de políticas para doações,
brindes e hospitalidades, especialmente no relacionamento com órgãos públicos também
é recomendável. “Dessa forma, o gestor terá como evitar riscos, dar mais segurança às
suas decisões, planejar ações e garantir que os resultados sejam alcançados num
cenário real, apoiado em dados mais robustos e confiáveis”, conclui.