Com o tema ‘O telediagnóstico dentro do ciclo de cuidados’, encontro virtual trouxe casos de sucesso e dados que validam a necessidade da telessaúde
25 de novembro de 2020
A edição 2020 do Global Summit Telemedicine & Digital
Health, realizada esse ano em uma plataforma digital a fim de cumprir as
recomendações impostas pela pandemia de COVID-19, trouxe muitos debates sobre
as tendências que estão transformando o mundo da saúde. A Associação Brasileira
de Medicina Diagnóstica (Abramed) promoveu um debate sobre o papel do
telediagnóstico dentro do ciclo de cuidados, moderado por Wilson Shcolnik,
presidente do Conselho de Administração da entidade, e participação de
Cristovam Scapulatempo, gerente médico de patologia avançada, imunohistoquímica
e patologia molecular da DASA; e César Nomura, diretor de medicina diagnóstica
do Hospital Sírio-Libanês.
Ao longo do debate foram apresentadas as diversas vantagens
do telediagnóstico, possibilidade de transmissão de prontuários e laudos
médicos para especialistas graças às plataformas que permitem que as imagens e
vídeos gravados mantenham a qualidade necessária para o diagnóstico mesmo após
passarem pelo processo de compressão.
Segundo Scapulatempo, esse ramo é excepcional por sanar
algumas das principais dificuldades do sistema como, por exemplo, os custos de
deslocamento para centros especializados e a falta de assistência local
associada à infraestrutura precária de algumas regiões. Porém os entraves para
que o telediagnóstico se firme ainda estão presentes.
“Talvez o maior desafio de todos, principalmente em um país
como o nosso, seja a velocidade de conexão e o tamanho da banda, fatores
extremamente limitantes. Na Europa, por exemplo, links de 1gb são comuns, mas
no Brasil é difícil conseguir. Por isso já começamos em desvantagem”, comentou
o especialista da DASA.
A conectividade, de fato, precisa ser olhada com mais
profundidade. Principalmente agora que a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD)
está vigente. “Em qual nível de conectividade vocês imaginam que estejamos hoje
e o que pode nos gerar problemas em termos de segurança de dados?”, perguntou
Shcolnik.
“Temos problemas de infraestrutura, às vezes temos de
contratar links dedicados, que são caros. Temos, inclusive, problemas de
energia elétrica. Se em janeiro começar a chover e cair uma árvore, teremos
interrupção do fornecimento. Por isso o custo do Brasil é tão alto. Quanto à
LGPD, nossa maior preocupação está em como ela vai funcionar. Nesse primeiro
momento precisa ser mais educativa do que punitiva. Não pode virar foco para
arrecadação de recursos, um mercado negro”, enfatiza Nomura.
Pensando em acesso, Shcolnik falou sobre a disponibilidade
de profissionais em todas as regiões brasileiras. “Sabemos que uma das
vantagens do telediagnóstico está em garantir o acesso em locais onde
especialistas não estão disponíveis”, disse. Complementando esse raciocínio,
Scapulatempo comentou que chegou a fazer uma visita em um hospital da região
norte do país onde encontrou peças cirúrgicas de pacientes com câncer há mais
de três anos sem macroscopia realizada. “É a realidade em alguns locais onde
falta acesso ao médico patologista, profissão escassa e mal remunerada”,
apontou.
Falando sobre as restrições impostas pelo Conselho Federal
de Medicina (CFM), o diretor da DASA vislumbrou um cenário benéfico caso
caíssem essas limitações. “Imagina, por exemplo, a Empresa Brasileira de
Serviços Hospitalares (Ebserh) com uma central de patologistas para que todos
os hospitais federais tivessem acesso?”. “Quem sabe o tempo ajude a modificar
essas exigências”, desejou Shcolnik.
Enquanto a telepatologia sofre com restrições, a
teleradiologia – que teve início há 15 anos – enfrentou um caminho mais livre
para seguir e se consolidar. “Não tivemos esses grandes entraves pois quando
olharam para a teleradiologia, todos já estavam fazendo”, disse Nomura.
Patologia Digital
Para exemplificar a importância da telepatologia no Brasil,
Scaputatempo apresentou dados do setor. Segundo ele, hoje são 3.400
patologistas atuando no país, ou seja, 1,55 para cada 100 mil habitantes. O Sudeste
concentra 54% desses profissionais e há pouquíssimos em atuação na região Norte.
“A gente precisa oferecer esse diagnóstico rápido e preciso para que os
pacientes tenham melhor chance de tratamento. Apenas olhando esses números
conseguimos justificar a necessidade da telepatologia”, comentou.
Entre os benefícios da patologia digital apresentados pelo
especialista da DASA estão: criação de uma rede nacional e internacional de
patologistas; implementação de subespecialidades; fácil acesso às lâminas
quando necessário para revisão e discussão de casos à distância; casos de
pacientes espalhados pelo Brasil sendo analisados por profissionais experientes
e especializados; projetos com inteligência artificial; capacidade de produção
fora do núcleo técnico operacional; e segurança por não haver trânsito de material
biológico para fora desse núcleo.
Teleradiologia na prática
Para falar sobre a relevância da teleradiologia, Nomura
apresentou detalhes de um projeto criado para melhorar o diagnóstico da
COVID-19. O RadVid19, desenvolvido pelo Inova HC, ofereceu um serviço de
inteligência artificial para avaliação de tomografias de tórax. “Lembrando que
no começo de fevereiro ainda tínhamos muita dificuldade para oferecer testes
RT-PCR para detecção da infecção pelo novo coronavírus, as imagens de tórax
eram um dos caminhos”, comentou.
Com inteligência artificial, o hospital faz a tomografia e
disponibiliza as imagens na nuvem. Essas imagens são processadas por dois
algoritmos que trazem dados como a probabilidade, de 0% a 100%, daquela imagem
representar um caso de COVID-19 e qual o grau de acometimento pulmonar daquele
paciente.
“Em hipótese alguma a ideia é substituir o médico
radiologista, até porque a ferramenta pode errar. A proposta é ser um auxílio a
esse profissional. Porém é interessante observar que fizemos alguns
comparativos e vimos que o médico radiologista tem certa tendência a
superestimar o grau de acometimento pulmonar dos pacientes com COVID-19. Por
isso é fundamental sairmos dos apontamentos qualitativos para os
quantitativos”, disse Nomura.
Montada em um mês, a infraestrutura iniciou o trabalho em 4
de maio. Até hoje já foram mais de 30 mil acessos à plataforma que tem cerca de
50 hospitais conectados e já analisou 18 mil tomografias. Considerado um dos
maiores bancos de dados de tomografia de COVID-19 do mundo, a ferramenta chegou
a avaliar 180 casos diariamente e, hoje, checa cerca de 50 exames ao dia. “É
uma iniciativa sem custo para qualquer instituição, pública ou privada, que
queira acessar”, finalizou o especialista.