Novas variantes do novo coronavírus e o papel da medicina diagnóstica após a vacinação populacional foram alguns dos temas abordados
03 de março de 2021
A terceira edição do Bootcamp Abramed de Jornalismo em Saúde
contou com a participação de jornalistas da grande mídia nacional interessados
nas atualizações acerca do papel da medicina diagnóstica na pandemia um ano
após a confirmação do primeiro caso de COVID-19 no país. O encontro virtual, realizado
dia 25 de fevereiro, pode ser assistido AQUI.
O Bootcamp iniciou com uma apresentação de Milva Pagano,
diretora-executiva da Abramed, que trouxe um rápido perfil da entidade. “Hoje,
nossas associadas são responsáveis por mais de 56% dos exames realizados na
saúde suplementar brasileira”, pontuou. A diretora também aproveitou para
enfatizar a relevância do jornalismo na luta contra a disseminação do novo
coronavírus e agradecer aos profissionais de mídia presentes.
Na sequência, Leandro Figueira, vice-presidente do Conselho
de Administração da Abramed e diretor comercial da Alliar Médicos à Frente,
trouxe dados atualizados sobre a participação da medicina diagnóstica privada
no controle da pandemia de COVID-19. “Mais de 40% dos diagnósticos da infecção
pelo novo coronavírus realizados no Brasil ao longo de 2020 foram feitos por
associadas à Abramed”, declarou. Segundo o executivo, essas empresas
realizaram, até 31 de dezembro, 10,1 milhões de testes, sendo 4,5 milhões
RT-PCR e 5,7 milhões de sorológicos.
Outro apontamento relevante feito pelo vice-presidente diz
respeito à queda no número de procedimentos eletivos durante o ano de 2020. Em
abril do ano passado, quando houve um pico de preocupação e isolamento social
no país, a queda na quantidade de autorizações emitidas pelos planos de saúde
tanto para exames quanto para terapias chegou a 62%. “Esses dados mostram que
deixamos de diagnosticar câncer, doenças cardíacas e distúrbios metabólicos
importantíssimos como a Diabetes. Certamente teremos uma demanda futura
desencadeada pelo atraso nesses diagnósticos”, disse. “Quanto mais tempo
demoramos para detectar, pior é o tratamento e o prognóstico”, completou.
Figueira também disse esperar que com a vacinação, voltemos
à sonhada “normalidade”, porém declarou que as sequelas que a pandemia está
deixando nos sistemas de saúde são muito importantes. “Precisamos dar voz a
todos aqueles que não foram tratados para evitar que eles permaneçam em filas,
aguardando seus atendimentos”, finalizou.
Da descoberta do vírus às novas variantes
A apresentação de Celso Francisco Hernandes Granato, médico
e diretor clínico do Grupo Fleury, trouxe explicações sobre as variantes do
novo coronavírus que estão aparecendo e assustam a população. Depois de fazer
um rápido panorama sobre o surgimento da COVID-19, detalhando desde a primeira
notificação de uma pneumonia desconhecida na China, Granato disse que “nem toda
mutação é ruim e nem toda mutação leva a consequências maiores”. Segundo o
especialista, que explicou todas as variantes já identificadas até o momento,
essas modificações na estrutura do vírus mostram uma evolução natural do
patógeno.
“A primeira mutação, em março do ano passado, rapidamente
substituiu a cepa original. A segunda mutação, prevalente na Inglaterra,
mostrou uma velocidade de replicação até 60% maior do que a anterior. A outra
variante, identificada primeiramente na África do Sul em dezembro, parece
permitir a reinfecção dos já infectados. E, agora, a modificação proveniente da
Amazônia brasileira carrega grande parte das mutações anteriores”, disse.
Para Granato, as principais implicações das variantes que
estão surgindo são: maior carga viral e maior potencial de disseminação do
vírus; formas clínicas mais graves da doença; escape do diagnóstico molecular,
da sorologia e, inclusive, das vacinas. Porém, o especialista reforça que, por
enquanto, esses impactos são potenciais e, exceto pela maior carga viral e
facilidade de transmissão, nenhum deles foi comprovado academicamente.
Evolução dos testes diagnósticos
A apresentação de Rafael Jácomo, diretor técnico do Sabin
Medicina Diagnóstica, destacou a evolução dos exames para detecção da COVID-19
desde o surgimento da pandemia. O especialista mostrou uma linha do tempo que
aponta a criação do kit de RT-PCR – até hoje considerado padrão ouro – em março
e segue com os testes imunocromatográficos disponibilizados em meados de abril;
os testes sorológicos para IgG, IgM e IgA no início de maio e os testes de
anticorpos totais no final deste mês; as alternativas para detecção da doença
na fase ativa como o RT-LAMP em junho; e os testes de antígeno em julho. Quem acompanhou
a palestra também pode compreender mais a fundo como funciona cada teste
disponível hoje no mercado.
De forma enfática, Jácomo reforçou a importância da
realização de todo e qualquer teste em um ambiente adequado e controlado como
forma de evitar problemas com os resultados, que podem deixar de ser
confiáveis. “Com a realização em locais que beiram o ridículo, como postos de
gasolina, vemos que o diagnóstico foi banalizado. Me parece quase óbvio que um
ambiente desse não é adequado. Imagine quantas substâncias voláteis estão nesse
posto e não sabemos qual a interferência delas nas amostras dos pacientes”,
explicou. No ano passado, a mídia denunciou espaços comerciais como postos de
gasolina e até pet shops realizando testes para COVID-19.
Considerando a necessidade de ampliar a capacidade de
testagem e, ao mesmo tempo, proteger os cidadãos, uma das alternativas
encontradas pelos laboratórios foi oferecer o exame em sistema drive-thru. O
tema também foi abordado pelo especialista, que enfatizou que para isso estudos
foram feitos e os espaços passaram por aprovação dos órgãos reguladores.
“Sempre que pensamos em alternativas, devem ser considerados todos os pontos
das legislações vigentes. Não podemos criar exceções que podem levar o paciente
ao risco”, disse.
Pandemia pós-vacinação
O que devemos esperar com a imunização advinda das vacinas?
José Geraldo Ribeiro, epidemiologista e assessor científico em Vacinas do Grupo
Hermes Pardini, trouxe uma boa perspectiva ao reforçar que, em Israel, já é
possível observar os reflexos positivos da campanha de vacinação. “Vemos o
alívio do sistema de saúde com a diminuição dos casos graves devido à uma boa
cobertura vacinal”, pontuou.
Uma das principais dúvidas quando se cogita uma vacinação em
massa está se poderemos considerar a imunidade de rebanho. Para Ribeiro, há
dúvidas. “Proteção de rebanho depende de fatores como modo de transmissão da
doença e da cobertura vacinal, principalmente daqueles grupos que transmitem
mais. Sabemos que as vacinas são excelentes para a proteção individual, mas não
que geram a proteção de rebanho”, disse. Segundo ele, especialistas já chegaram
a mencionar que com 80% da população vacinada estaremos protegendo as outras
pessoas, porém esse dado ainda é incerto quando se trata da COVID-19. “Existem
estudos principalmente da Pfizer e de Oxford, indicando diminuição da infecção,
da transmissão e apontando positivamente para esse cenário. Mas só teremos
certeza depois que usarmos, de fato, a vacina em massa”, explicou.
Pensando no setor de medicina diagnóstica, o especialista
também listou quais os principais impactos da vacinação contra a COVID-19.
Declarou que o RT-PCR segue sendo um ótimo teste com sensibilidade para
detecção das variantes – tendo sido inclusive responsável pela identificação da
variante inglesa – e que nesse momento em que outras cepas estão aparecendo,
essa vigilância constante torna-se ainda mais indispensável.
“Não basta saber quem tem Sars-CoV-2, precisamos saber qual
a variante para acompanhar a velocidade de infecção e o potencial de controle
das vacinas. E isso é um grande desafio tanto para os laboratórios públicos
quanto para os privados”, declarou. Segundo ele, ainda não temos laboratórios
capacitados à genômica e sequenciamento genético em grande quantidade no país,
visto que essa infraestrutura exige bastante tecnologia.
Outro cenário alertado pelo epidemiologista está na busca
por comprovação de imunidade após a vacina. “Médicos e pacientes querem provas
sorológicas para saber se a vacina os protegeu, porém, essas provas ainda não
estão disponíveis. Todos nós estamos nos preparando para explicar, para nossos
colegas médicos, que os exames laboratoriais que temos até o momento não são
capazes de afirmar a proteção. Esse é um grande desafio que o setor vai
vivenciar na medida em que os imunizantes forem sendo aplicados”, declarou.
Em concordância com os pontos já apresentados por Figueira
no início do debate, Ribeiro enfatizou que outras doenças não esperam a
pandemia passar para se manifestarem e que muitos exames ficaram represados nos
últimos meses. “O número de mamografias no Brasil caiu pela metade”, alertou.
Antes de encerrar sua apresentação, Ribeiro parabenizou a
atuação de todos os associados à Abramed na pandemia. “Esse trabalho foi
imprescindível para o controle da doença no Brasil. Provavelmente a rede
pública, sem o apoio da rede privada, teria muito mais dificuldade”, disse.
Encerramento
Para encerrar as apresentações, Wilson Shcolnik, presidente
do Conselho de Administração da Abramed, aproveitou seu discurso para enfatizar
a importância dos exames diagnósticos no controle da saúde populacional.
Lembrando que muitos exames deixaram de ser realizados durante as fases
críticas da pandemia e que isso fará com que diagnósticos permaneçam
represados, o diretor disse que todos devem se recordar que “prevenir custa
menos do que tratar”.
Essa fala foi pontuada pela explicação de que ainda há, no
país, um certo debate sobre exames representarem custos e despesas
inapropriados. “Quanto custam esses exames para o sistema de saúde? Exames não
representam os maiores gastos totais da saúde no nosso país. Os laboratoriais
representam apenas 3% e os exames de imagem, cerca de 12%. Por isso precisamos
continuar prestando esse serviço tão importante para os cuidados e a
assistência”, disse.
Após as apresentações, o Bootcamp Abramed de Jornalismo em
Saúde permitiu que todos os jornalistas presentes tirassem suas dúvidas com os
especialistas. Participaram profissionais da Rede Globo, Record TV, SBT, TV
Band, BBC Brasil, Folha de S. Paulo, Jornal O Globo, Revista Exame, Correio
Braziliense, Veja Saúde, UOL, Jovem Pan, entre outros veículos de grande porte
e mídias especializadas. A sessão de perguntas e respostas, que trouxe mais
explicações sobre as novas variantes, imunidade de rebanho, eficiência das
vacinas e retorno à normalidade, pode ser vista diretamente clicando AQUI.