Sempre que pensamos em pioneirismo em saúde, as primeiras referências nacionais automáticas estão nos grandes centros médicos de São Paulo e do Rio de Janeiro. Essa percepção não é diferente quando esmiuçamos o mercado de medicina diagnóstica, já que as maiores empresas do setor estão instaladas nessas regiões e despontam com inovação e alta tecnologia.
Porém, mesmo em um país continental como o Brasil, estamos conseguindo mudar essa mentalidade, já que podemos observar uma redução do gap que existia entre esses grandes centros e outras regiões.
Como comprovação desse desenvolvimento, temos dados do Cadastro Nacional dos Estabelecimento de Saúde no Brasil (CNES) que, publicados no Painel Abramed 2019 – O DNA do Diagnóstico, mostram que o número de unidades de Serviço de Apoio à Diagnose e Terapia (SADT) cresceu 66,6% nos últimos dez anos, atingindo um total de 24.763 mil unidades em dezembro de 2018.
Recortando as regiões Norte e Nordeste, temos um boom ainda mais interessante de ser analisado: a quantidade de estabelecimentos cresceu 91% no Norte e 68,5% no Nordeste do país no mesmo período.
A incorporação tecnológica, que surge para melhorar a qualidade dos exames e ampliar o acesso da população a diagnósticos de imagem mais precisos, tem sido uma das facilitadoras para a equiparação do atendimento prestado nas megalópoles aos serviços prestados em todo o restante do território nacional.
Sólida realidade fora do eixo Rio-São Paulo, a tecnologia de ponta pode ser identificada, por exemplo, no oferecimento do exame de PET/CT (acrônimo de tomografia por emissão de pósitrons/tomografia computadorizada) em diversas regiões do país. Esse exame, inserido no rol da Medicina Nuclear e importante aliado no diagnóstico e no combate ao câncer, ficou restrito ao Sudeste e ao Sul do Brasil por muitos anos, mas hoje já pode ser encontrado em clínicas como a nossa, no Ceará, que acabou de colocar em funcionamento seu segundo aparelho de PET/CT, levando ganhos a pacientes e médicos da capital cearense ao reduzir o tempo do exame e melhorar a qualidade da definição da imagem. Isso sem falar na Internet, que promove uma melhor troca de informações, beneficiando todo o sistema de saúde.
No mesmo caminho de desenvolvimento temos cada vez mais médicos especialistas fora dos grandes centros e isso faz com que a medicina diagnóstica esteja em constante evolução para ser cada vez mais o apoio que os médicos necessitam para a tomada de decisões e definição das condutas terapêuticas.
Outros resultados do crescimento do setor de diagnóstico em todo o território nacional está, além do incremento do parque tecnológico, na evidente busca por qualidade e humanização; no foco em acreditação hospitalar e vários outros selos de qualidade e no reconhecimento de capitais como Salvador (BA), Recife (PE), Fortaleza (CE), Teresina (PI) e São Luís (MA) como importantes polos de saúde.
Mas, como em todo processo de desenvolvimento, há as dores do crescimento trazendo grandes desafios ao dia a dia dos centros de diagnósticos fora do eixo Rio-São Paulo. Dentre eles, podemos citar a distância geográfica dos centros de distribuição de peças de reposição para os equipamentos de diagnóstico, já que a maioria deles está em São Paulo gerando impacto relevante quando há a necessidade de manutenção de equipamentos com substituição de peças. Não é raro que as empresas tenham de esperar vários dias para consolidar essa manutenção colocando o equipamento novamente em funcionamento.
Somado a isso, encara-se a prática de recolhimento do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) entre os Estados da Federação dificultando a chegada dos itens solicitados. Como exemplo, vemos a simples troca de um fiscal na fronteira estadual podendo atravancar e até mesmo impedir a entrega desses itens às clínicas, mesmo quando essas clínicas são consumidoras finais, ou seja, isentas de inscrição estadual e do pagamento de tal tributo.
Outro desafio bastante relevante está no acesso mais restrito da população que se encontra fora do eixo Rio-São Paulo a planos de saúde. Com diversos aspectos socioeconômicos influenciando fortemente a oferta e a demanda dos serviços de saúde, é notória a associação entre o porte populacional e a distribuição do número de beneficiários de planos de assistência médica.
Mesmo que, segundo dados do Painel Abramed, a região Nordeste tenha incorporado mais de 1,6 milhões de beneficiários de planos de saúde nos últimos dez anos enquanto, no mesmo período, a região sudeste tenha ganhado 1,4 milhões de vidas, números do Sistema de Informações de Beneficiários (SBI) da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), também publicados no Painel, mostram que mais da metade dos beneficiários (52,2%) está localizada nos 46 municípios mais populosos da nação, ou seja, que têm acima de 500 mil habitantes e nos quais a taxa de cobertura alcança 37,9% da população.
Na outra vertente, em quase 90% dos municípios brasileiros com até 50 mil habitantes, apenas 7,8% da população está coberta pelo sistema suplementar. Essa restrição, diretamente relacionada com o menor poder aquisitivo, resulta em discrepâncias remuneratórias entre as regiões: enquanto os grandes centros conseguem ofertar exames a custos menores e recebem remunerações mais altas por eles, as regiões mais remotas têm mais despesas – já que os equipamentos, a manutenção e os insumos acabam mais caros – e menos receita a cada exame executado. Para isso, contamos com um olhar minucioso por parte dos órgãos regulatórios como a ANS e o Conselho de Saúde Suplementar (Consu).
Com a restrição ao mercado de planos de saúde em algumas regiões, o SUS tem papel ainda mais importante no acesso da população à medicina diagnóstica, principalmente no interior dos Estados onde existem poucos serviços de diagnóstico do próprio governo. Nesses locais, as parcerias público-privadas são indispensáveis e fazem com que clínicas e hospitais privados conveniados ao Ministério da Saúde ofertem os serviços para suprir as demandas populacionais. Porém as tabelas remuneratórias do SUS estão congeladas há quase 20 anos e o complemento dos valores pagos aos prestadores de serviços pelo sistema público, que deveria vir das esferas municipais ou estaduais, quase nunca é garantido.
Sobretudo e diante deste cenário de oportunidades e desafios, podemos dizer que continuamos a tomar os grandes centros de diagnóstico do eixo Rio-São Paulo como referência, embora tenhamos a certeza de que muitas soluções já surgem também em outras regiões e de que isso é fundamental para médicos e pacientes que precisam contar com medicina diagnóstica de qualidade nos quatro cantos do Brasil.
*Juliano Esteves Viana é CEO do Grupo Omnimagem