Evento virtual contou com apresentações de médicos especialistas, sob moderação de Wilson Shcolnik
O Brasil registrou 4.876 casos confirmados de monkeypox, a varíola dos macacos, segundo último boletim do Our World in Data, publicação digital especializada em mostrar pesquisas e dados sobre mudanças nas condições de qualidade de vida ao redor do mundo. Para discutir esse importante tema de saúde pública, a Associação Brasileira de Medicina Diagnóstica (Abramed) e o Sindicato dos Hospitais, Clínicas e Laboratórios do estado de São Paulo (SindHosp), com apoio da Associação Paulista de Medicina (APM), realizaram, no dia 31 de agosto, o webinar “Monkeypox: como diagnosticar e prevenir?”.
Uma das palestrantes foi Carolina dos Santos Lázari, médica assessora para análises clínicas em Infectologia do Grupo Fleury e chefe da Seção de Biologia Molecular da Divisão de Laboratório Central do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP), que apresentou o tema “Diagnóstico laboratorial”.
Para falar sobre “Aspectos clínico-epidemiológicos”, foi convidado Eduardo Alexandrino Servolo de Medeiros, médico infectologista, professor da Disciplina de infectologia do Departamento de Medicina da EPM-Unifesp, presidente da Comissão de Controle de Infecção Hospitalar do Hospital São Paulo – HU-Unifesp, pesquisador do CNPq e diretor científico da Sociedade Paulista de Infectologia.
A moderação ficou com Wilson Shcolnik, presidente do Conselho de Administração da Abramed, ex-presidente da Sociedade Brasileira de Patologia Clínica/Medicina Laboratorial (SBPC/ML) e vice-presidente do SindHosp.
Embora a monkeypox exista há muito tempo na África em forma de surto em algumas áreas e em nível endêmico em outras, a doença da qual se fala agora é bem diferente, como destacou Medeiros. “A forma de transmissão, a evolução e o tipo de disseminação não são iguais aos que ocorrem na África, embora seja um vírus muito semelhante. Vamos aprender com o tempo”, disse.
No momento, os gráficos mostram quedas no número de casos na Europa, embora ainda esteja em crescimento na região das Américas, porém com evolução menor em comparação ao registrado do início ao meio do mês de julho. “A doença vai chegar ao seu pico e, provavelmente, com o tempo, o número de casos vai diminuir”, expôs Medeiros.
As medidas de prevenção da doença citadas por ele foram: higienização das mãos, precauções de contato e gotículas, uso de óculos, máscaras, avental e luvas descartáveis para atendimento, manter o paciente em quarto único e preferencialmente em pressão negativa, cobrir as lesões se for preciso sair de casa, no transporte e no ambiente hospitalar, higiene ambiental, principalmente roupas e objetos, e não sacudir roupas para evitar a dispersão de partículas.
Durante sua palestra, Carolina explicou que o exame diagnóstico para monkeypox é o RT-PCR específico para a doença. Para a coleta, a orientação é fazer o raspado da lesão cutânea ou mucosa, e é preciso utilizar EPIs tanto para contato quanto para gotículas, como óculos de proteção. Os swabs não podem ser de algodão nem ter haste de madeira, ambos precisam ser de fibra sintética. O acondicionamento da amostra deve ser em tubo seco, sem meio de transporte.
Em termos de lesão melhor para diagnóstico, a preferência é pela vesicular íntegra, pois o líquido contido é rico em quantidade de vírus. Na lesão rompida, é preciso fazer raspagem e, no caso de lesão crostosa, desprender essa crosta e enviá-la para análise. “Estão em processo de validação coletas menos invasivas”, salientou Carolina.
Vale lembrar que qualquer laboratório com nível de biossegurança adequado para o processamento de covid-19 também está habilitado para monkeypox. “Incentivamos o aumento da capacidade diagnóstica tanto na rede pública quanto na rede privada porque certamente os oito centros públicos credenciados pelo governo não são suficientes para cobrir um país com as dimensões do nosso”, comentou Carolina.
Shcolnik questionou se há alguma notícia da incorporação do exame diagnóstico para monkeypox também para beneficiários da Saúde Suplementar, assim como aconteceu nos casos de covid-19, citando que, em São Paulo, 40% da população é beneficiária da Saúde Suplementar.
De acordo com Carolina, houve uma reunião extraordinária no dia 16 de agosto entre o comitê que se dedica ao tema e a Associação Nacional de Saúde Suplementar (ANS) para discutir as novas inclusões no rol de procedimentos de cobertura obrigatória pelas operadoras de planos de saúde. As entidades que fazem parte desse comitê estão reunindo documentação para que haja uma nova discussão sobre o assunto. “Do ponto de vista médico, somos a favor dessa inclusão, até porque é uma doença que veio de fora do país e tem mais relação com pessoas que contam com cobertura de convênio, devido à classe social econômica.”
Carolina relatou que as pessoas que buscam consultórios privados vinculados ao seu convênio estão tendo dificuldade de obter o exame porque seria necessário passar por outro atendimento na rede pública, ou, então, o médico do consultório não tem acesso ao Núcleo de Telessaúde (NUTES). “Algumas dificuldades diagnósticas podem ser suplantadas pelo maior acesso via Saúde Suplementar”, ressaltou.
Com base na palestra de Eduardo, que mencionou que 70% dos casos da doença foram diagnosticados no estado de São Paulo, Shcolnik perguntou ao palestrante se esse número seria uma questão de subnotificação ou se os oito laboratórios públicos que estão credenciados não estão dando conta dos casos suspeitos.
Medeiros disse que é um pouco dos dois pontos. “Às vezes o paciente tem poucas lesões e elas podem passar despercebidas. Vale lembrar também que a população de São Paulo é grande, então seria preciso avaliar proporcionalmente. Outra questão é a realização de eventos importantes em São Paulo, atraindo muitos turistas, inclusive do exterior, que podem ter contribuído para a maior transmissão, já que a doença acomete mais homens que fazem sexo com homens”, explicou.
Carolina complementou, ainda, que o primeiro laboratório a ser credenciado pelo governo está em São Paulo, ou seja, as notificações começaram no estado. “Só nas publicações mais recentes do Ministério da Saúde apareceram outros laboratórios. O diagnóstico confirmado nas outras regiões fora do Sudeste estava com uma logística mais complicada até o meio do mês de agosto.”
Shcolnik lembrou que, durante a pandemia de covid-19, uma ampla rede de diagnóstico foi mobilizada para atender à demanda por testagem e que agora não se sabe como o surto de monkeypox progredirá, se será preciso contar com o apoio de laboratórios privados. “Será que esses laboratórios costumam reportar os dados de resultados às autoridades sanitárias?”, perguntou para a médica Carolina.
Por lei, os laboratórios são obrigados a notificar resultados de todas as doenças classificadas como de notificação compulsória. “Assim como o médico deve reportar o caso suspeito do ponto de vista clínico, o laboratório, quando tem um resultado positivo, precisa reportar independentemente de o médico ou o hospital de origem do paciente já o terem feito”, salientou.
Carolina disse, ainda, que foi publicada uma portaria que obriga os laboratórios públicos e privados a fazer a notificação desses casos via Rede Nacional de Dados em Saúde, assim como aconteceu com a covid-19. “É o melhor caminho, pois automaticamente todos os dados que o laboratório liberar no seu sistema interno já serão enviados diretamente para o DataSUS, consolidando e centralizando as informações.”
José Luiz Gomes do Amaral, presidente da APM, fez uma breve participação no webinar, parabenizando as entidades pela iniciativa, cujo objetivo é ajudar o setor a enfrentar situações difíceis e dar uma resposta adequada. O evento completo pode ser visto no YouTube do SindHosp, aqui.