Especial Hospitalar: Desafios e Oportunidades para a Implementação de Novas Tecnologias Diagnósticas

O último painel do Summit Abramed discutiu os caminhos e obstáculos que permeiam a adoção de novas tecnologias no setor de Medicina Diagnóstica.

A moderação foi conduzida por Cristovão Mangueira, diretor de medicina laboratorial do Hospital Israelita Albert Einstein, que começou com uma pergunta simples, mas crucial: “por que inovar?”.

Cristovam Scapulatempo, diretor médico de genética e patologia da Dasa, destacou que a inovação precisa ter propósito e foco no paciente. “Se olharmos para os últimos dez anos e tudo o que foi implementado, especialmente, fica claro o quanto a inovação foi decisiva para oferecer novas perspectivas de tratamento e segurança ao paciente.” Ele reforçou que a maior parte das inovações realizadas hoje é incremental, buscando melhorar processos, reduzir custos e ampliar o acesso sem comprometer a qualidade.

A visão foi compartilhada por Rafael Jácomo, diretor técnico do Grupo Sabin, que trouxe à tona o desafio da padronização da inovação em um país continental. “Inovar em São Paulo ou Brasília não é o mesmo que inovar em Gurupi ou Tangará da Serra. Um dos maiores desafios é garantir que essas novas soluções cheguem à ponta com efetividade – e, acima de tudo, sejam compreendidas e utilizadas por quem está lá”.

Ele também defendeu uma mudança de mentalidade: mais do que separar análises clínicas, imagem e anatomia patológica, é preciso encarar o diagnóstico de forma integrada e centrada no paciente.

Guilherme Ambar, da Seegene, acrescentou a importância de tornar as tecnologias mais acessíveis e escaláveis. Segundo ele, a inovação, para ser sustentável, precisa estar apoiada em pilares como educação médica, redução de custos e interoperabilidade.

“Investimos em tecnologias PCR que funcionam em máquinas menores, ocupam menos espaço e podem ser operadas em locais com infraestrutura limitada, porque sabemos que o desafio no Brasil é fazer a tecnologia chegar aonde ela é mais necessária”, afirmou Ambar.

O debate abordou ainda os dilemas da inteligência artificial na prática diagnóstica. Scapulatempo explicou que, embora haja avanços significativos, especialmente no apoio à decisão e controle de qualidade, o custo computacional ainda é uma barreira.

“Infelizmente, você não vê nenhuma empresa de inteligência artificial de patologia crescendo rapidamente como a gente vê em outras áreas, por causa do custo ainda muito alto. Hoje, a gente lida com um exame barato e que é caro para guardar. E você precisa guardar essas imagens para desenvolver o algoritmo. Não é todo laboratório que consegue arcar com isso.”

Ao final, os participantes foram unânimes ao afirmar que a inovação não deve aprofundar desigualdades, mas ajudar a reduzi-las. Tecnologias como o sequenciamento genético, antes restritas a poucos, já começam a se tornar mais acessíveis graças ao ganho de escala e à evolução da indústria.

Nesse contexto, a transformação tecnológica precisa ser acompanhada por estratégias que priorizem a organização e o uso inteligente dos dados, para que a adoção de novas ferramentas se traduza em impacto real na saúde da população.

A mensagem final foi clara: restringir a inovação por não ser, a princípio, universal é limitar o progresso. O desafio está em construir pontes entre avanço e equidade, garantindo que o setor privado também atue como vetor de democratização, ampliando o alcance de soluções que, hoje, salvam vidas e promovem qualidade de vida em larga escala.

Especial Hospitalar: Biologia molecular e a revolução na detecção precoce

A palestra de Guilherme Ambar, CEO da Seegene Brazil, durante o Summit Abramed na Hospitalar 2025, trouxe uma análise aprofundada sobre o impacto da biologia molecular na revolução do diagnóstico precoce. Com técnicas como o PCR em tempo real e o sequenciamento de nova geração, exames laboratoriais ganham agilidade, precisão e capacidade de detectar doenças antes mesmo do aparecimento dos sintomas — o que tem efeito direto sobre desfechos clínicos, custos do tratamento e qualidade de vida dos pacientes.

Segundo Guilherme, estudos recentes demonstram que exames moleculares podem reduzir em até 85% o tempo de internação hospitalar e gerar economias significativas em tratamentos, especialmente no caso de doenças oncológicas, infecciosas e genéticas.

“Estamos falando de tecnologias que já têm mais de 30 anos de aplicação, mas que hoje precisam ser ampliadas em termos de acesso e aplicadas com mais estratégia dentro da jornada do paciente”, reforçou.

Durante a apresentação, ele mostrou evidências concretas do impacto positivo dessas tecnologias em pacientes com câncer, recém-nascidos com doenças raras e infecções congênitas, além de exemplos sobre o uso de ferramentas moleculares durante a pandemia de Covid-19. “A biologia molecular não apenas melhora o diagnóstico, como também reduz custos ao longo da jornada. Mesmo com um custo inicial mais alto, ela evita terapias equivocadas, reduz internações e melhora o prognóstico”, destacou.

O palestrante também alertou para a necessidade de superar barreiras de custo e ampliar a incorporação desses exames na Saúde Pública e Suplementar. “O próximo passo é democratizar o acesso, treinar profissionais e fomentar políticas públicas que reconheçam o valor dessas tecnologias na atenção primária e na gestão de saúde populacional”, concluiu.

Especial Hospitalar: Summit Abramed debate diagnóstico como ponto de partida para a gestão da Saúde

A abertura institucional do Summit Abramed foi realizada pela diretora-executiva da Associação, Milva Pagano, que também moderou o primeiro painel do evento. Com o tema “A Importância do Diagnóstico na Gestão da Saúde”, o debate contou com o presidente do Conselho de Administração da entidade, Cesar Nomura, Paula Campoy, presidente da ASAP – Aliança para Saúde Populacional, Gustavo Campana, diretor médico no DB Diagnósticos e Ademar Paes Júnior, membro do Conselho de Administração da Abramed.

Milva reforçou a necessidade de “desfragmentar o olhar sobre o diagnóstico”, destacando que ele deve ser entendido como um elemento estruturante da jornada de cuidado. Também alertou para o desafio que o setor enfrenta para mensurar desfechos clínicos com base em dados integrados que demonstrem o valor da Medicina Diagnóstica para o sistema de Saúde.

Cesar Nomura deu continuidade destacando que a sustentabilidade e qualidade da Medicina Diagnóstica estão diretamente associadas à inovação e automação. “O que nos trouxe até aqui foi inovação, e é ela que continuará nos levando adiante. Nossa responsabilidade é seguir investindo em tecnologia e qualidade para mantermos o protagonismo da Medicina Diagnóstica na sustentabilidade do sistema de Saúde”, defendeu. Para Nomura, o papel das associações é essencial para promover equilíbrio entre os diferentes interesses da cadeia e construir soluções integradas para o setor.

Na mesma linha, Gustavo Campana ressaltou o potencial estratégico dos dados gerados pelos exames laboratoriais e de imagem. “Precisamos sair do modelo fragmentado e desestruturado. A Medicina Diagnóstica pode ser o eixo de um sistema mais coordenado, com base em dados objetivos que nos permitam influenciar os desfechos clínicos e financeiros”, afirmou. Para ele, tecnologias como Inteligência Artificial só trarão impacto real se apoiadas em estruturas de big data, interoperabilidade e indicadores bem definidos.

Por outro lado, Ademar Paes Júnior trouxe uma provocação contundente: embora os exames representem cerca de 17% a 18% do custo assistencial das operadoras, seus dados ainda são pouco usados para definir estratégias populacionais e precificar Planos de Saúde. “Temos dados estruturados e de alto valor, mas seguimos guardando tudo a sete chaves, sem transformar isso em inteligência para melhorar a performance do sistema”, alertou.

Ele defendeu que os laboratórios assumam uma postura mais ativa, criando áreas de dados capazes de transformar informações clínicas em ferramentas para decisões mais precisas, contratos mais equilibrados e políticas de Saúde mais efetivas.

Encerrando o painel, Paula Campoy, presidente da ASAP, reforçou que diagnóstico é antecipação, “é entender o risco da população, personalizar o cuidado e garantir que o paciente seja o centro. Precisamos resgatar o propósito da Saúde no país — cuidar das pessoas — e o diagnóstico é a porta de entrada”.

Paula também fez críticas à visão de curto prazo nas decisões assistenciais e lembrou que exames normais também têm valor, pois evitam procedimentos desnecessários. “Não é quanto custa fazer, é quanto custa não fazer”, sintetizou.

O papel do diagnóstico precoce no enfrentamento de doenças silenciosas

*Por Paula Campoy

Que o diagnóstico precoce é uma ferramenta essencial para reduzir despesas com tratamentos, potencializar uma cultura de medicina preventiva no país e melhorar a jornada de cuidados junto aos pacientes, não deveria haver dúvidas.

Estudos do setor indicam que mais de 20 mil internações por ano poderiam ser evitadas com um olhar mais estruturado sobre a atenção primária, especialmente com o uso sistemático de exames laboratoriais e de imagem que, graças à evolução tecnológica, tornam-se cada vez mais precisos, acessíveis e eficientes.

Em termos financeiros, essa redução de internações representa um potencial de economia de até R$ 400 milhões por ano para o sistema de saúde brasileiro — recursos que poderiam ser redirecionados para ampliar o acesso, fortalecer redes de atenção primária e reduzir desigualdades estruturais.

Ainda assim, há um olhar de curto prazo que alcança também o setor de Saúde Suplementar para o qual, a priorização dos investimentos em Medicina Diagnóstica – que, como vimos, podem gerar sustentabilidade financeira, impacto em desfechos e eficiência operacional — ainda é vista, muitas vezes, como custo. A pergunta certa, nesse cenário, não é ‘quanto custa diagnosticar?’ — e sim ‘quanto custa não diagnosticar?’

Além disso, é importante salientar que, do ponto de vista estritamente econômico, os exames laboratoriais representam hoje cerca de 17% do custo assistencial das operadoras, proporção que se manteve estável ou mesmo se reduziu nas últimas décadas, a despeito do aumento expressivo da complexidade diagnóstica e da alta na demanda por exames.

Ainda assim, tanto na prática assistencial quanto na formulação das políticas de Saúde, a negligência diante das doenças assintomáticas ainda é estrutural. Diabetes, hipertensão e doença renal crônica avançam de modo insidioso em milhões de brasileiros, transformando o tempo, que poderia ser um ativo estratégico da medicina, em vetor de dano cumulativo. Para elucidar esse cenário, segundo o IBGE, mais de 20 milhões de brasileiros já convivem com a diabetes, necessitando de um acompanhamento contínuo de exames laboratoriais para um cuidado mais eficiente de seus quadros clínicos.  

Nesse cenário, o diagnóstico precoce não é um recurso adicional, mas sim condição elementar de sustentabilidade para o ecossistema de Saúde nacional. É preciso reforçar também que não estamos falando apenas de diagnósticos complexos: exames laboratoriais simples, como hemogramas, são determinantes para a identificação de uma série de doenças silenciosas, incluindo casos de leucemia.

E o desafio aqui, não é de capacidade técnica, operacional ou tecnológica: na verdade, é animador observar que a inovação tem avançado de modo expressivo e contínuo no campo da Medicina Diagnóstica.

Segundo dados do Painel Abramed 2024, por exemplo, cerca de 27% dos investimentos realizados pelas principais empresas do setor em 2023 foram direcionados à inovação. Além disso, a Associação indica que, também em 2023, houve um aumento de 54% no número de exames ou laudos acessados digitalmente em relação a 2022. Na comparação com 2021, o volume dobrou. Em outras palavras: estamos falando de um contexto que favorece a integração de um ambiente que, conforme supracitado, segue muito fragmentado no Brasil.

Ainda em relação aos avanços tecnológicos, mais de 50% dos algoritmos de IA na Saúde foram desenvolvidos a partir de dados do campo da Medicina Diagnóstica. Trata-se, portanto, de uma área com processos estabilizados, resultados objetivos e forte capacidade de entrega.

No entanto, essa capacidade precisa estar vinculada à interoperabilidade e ao compartilhamento de dados entre os agentes da Saúde Suplementar, muitos dos quais já possuem bases de big data valiosas, mas precisam avançar na integração de data lakers modernos, capazes de revolucionar o cuidado com os pacientes e a prevenção de doenças silenciosas no Brasil.

Nesse mesmo sentido, é urgente o desenvolvimento de políticas públicas que favoreçam o uso inteligente e precoce dos exames; a conexão real entre os sistemas público e privado; e a valorização da Medicina Diagnóstica como eixo estruturante do cuidado — e não apenas como ferramenta de confirmação clínica.

Finalmente, associações e entidades do setor devem assumir um papel decisivo para fomentar a colaboração e o fortalecimento de um modelo de Saúde mais integrado e sustentável no Brasil. O diagnóstico precoce, afinal de contas, é não só um instrumento essencial para o enfrentamento de doenças silenciosas, mas também a porta de entrada para o cuidado e promoção da saúde populacional.